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Resolução do BES e do Banif engorda offshores

Sábado, Março 18th, 2017

Citamos

Diário de Notícias

Corrida a offshores em 2014 e 2015 coincide com resoluções. Portugueses declararam quatro mil milhões no final de junho de 2016

Os portugueses tinham qualquer coisa como quatro mil milhões de euros em contas offshores (paraísos fiscais) no final do primeiro semestre de 2016, mais coisa, menos coisa o mesmo que no final de 2015. Estes são os valores declarados de forma “voluntária” pelos países ao Fundo Monetário Internacional (FMI).

Mas antes do primeiro semestre do ano passado houve dois momentos decisivos em que o envio de capitais portugueses para territórios considerados pouco ou nada cooperantes em matéria fiscal e de partilha de informação deu grandes saltos.

O primeiro momento foi no primeiro semestre de 2014 (aumento de 15% no envio de capitais para offshores), antes da resolução do BES (3 de agosto desse ano); e o segundo salto aconteceu no primeiro semestre de 2015 (aumento de 13%), antes da resolução do Banif (19 de dezembro desse ano), indicam dados novos do Coordinated Portfolio Investment Survey. Além dessas verbas, há muito mais dinheiro a circular e a ser enviado de Portugal para esses territórios de privilégio, mas não cai no radar do FMI porque não é comunicado.

Esta base de dados resulta de “um exercício voluntário de coleção de dados conduzido no âmbito das atividades do Fundo” junto dos vários países sócios, explica o FMI. Nem todos participam, claro.

Na lista relativa a Portugal, compilada pelo Dinheiro Vivo com base na classificação oficial das Finanças de “territórios e regiões com regimes de tributação privilegiada claramente mais favoráveis”, dos 78 offshores possíveis, só foram detetados patrimónios em 12 deles.

Os territórios offshores mais apetecíveis nestes últimos 17 anos (a lista do FMI começa em 2001 e termina no primeiro semestre de 2016) são claramente as ilhas Caimão, a ilha de Jersey (que só deixou de ser offshore neste ano) e as Ilhas Virgens Britânicas.

Panamá quase invisível

Curiosamente, uma das regiões que mais têm dado que falar nos últimos meses, o Panamá, é quase irrisória. As autoridades e entidades nacionais não têm informação para enviar de forma “voluntária” ao FMI. Segundo a instituição de Washington, os portugueses só tinham cinco milhões de euros no Panamá. Antes disso, esse país da América Central só aparece três vezes (2001, 2005 e 2006), com valores parqueados na casa dos dez a 20 milhões de euros.

Números magros que contrastam com informações recentes, que apontam o Panamá como destino preferencial do BES para drenar fundos de Portugal e que acabaram por não ser declarados ao fisco. Em causa estão dez mil milhões de euros não tratados pelas Finanças, dos quais 7,8 mil milhões terão saído do BES para o Panamá “entre 2012 e 2014”, e seria dinheiro das vendas de petróleo da companhia estatal Petróleos de Venezuela. A transferência de valores do BES para offshores acontece “nos dois anos antes da resolução do banco”, escreveu há duas semanas o Jornal Económico.

Em março de 2015, sete meses depois do colapso do BES, Carlos Tavares, na altura presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), foi à comissão parlamentar de inquérito à Gestão do BES e do GES dizer que “foram identificados praticamente todos os comitentes [os que mandaram fazer os negócios] das operações realizadas na última semana antes da resolução”, adiantando que seriam “80 investidores que fizeram vendas expressivas de ações do BES”, onde “predominam os institucionais estrangeiros”. “Os particulares são sobretudo nacionais e há investidores permanentes, ou seja, ligados ao BES, designadamente através de offshores. Muitos tinham adquirido ações após o aumento de capital”, explicou Carlos Tavares, hoje consultor da CGD.

Bomba só rebenta em 2017

Já neste mês, Helena Borges, a diretora-geral dos Impostos, foi ao Parlamento mostrar uma lista de 20 declarações de transferências para offshores com divergências enormes entre o que foi declarado e o que efetivamente foi canalizado para os ditos paraísos. Até abril de 2016, os valores declarados a título de transferências para offshores totalizavam 658 milhões de euros, mas depois de corrigidos os erros (só em janeiro deste ano), o valor real dispara para 10,5 mil milhões de euros. É a tal discrepância de 9,8 mil milhões de euros (quase dez mil milhões) que foram para os paraísos fiscais, mas que ficaram ocultos até agora.

Na lista das 20 declarações submetidas, a maior em discrepância é uma no valor de três mil milhões de euros entregues a 29 de julho de 2014, faltavam cinco dias para o BES implodir. Ao longo de 2015, sucederam-se as declarações de transferências de capitais (subavaliadas) entre 8 de junho e 6 de novembro. O Banif seria resolvido no mês seguinte. O total de erros ocultados em 2015 ascende a 3,4 mil milhões de euros, valores que entretanto foram para offshores.

“Toda a gente sabe que foi muito dinheiro para lá antes da resolução do BES, mas as coisas podem não estar necessariamente ligadas, nem têm de estar. A carga fiscal tem subido muito e nesses anos continuava a haver um sentimento de risco em Portugal, isto é, quem tinha dinheiro podia não estar a querer fugir aos impostos, não queria era perder capital se houvesse um bail in [resgate interno], queria otimizá-lo”, afirma Filipe Garcia, gestor da consultora Informação de Mercados Financeiros.

“Eram os bancos que, em boa medida, estavam a fomentar, a propor essas soluções de investimento aos clientes empresariais e particulares, não o contrário”, acrescenta o economista.

A partir dos dados do FMI, não dá para ver bem o Panamá, mas nota-se um aumento expressivo (17%) nos fundos enviados para as Caimão, no primeiro semestre de 2014, totalizando quase três mil milhões de euros. No segundo semestre de 2014, que apanha todo o mês de julho, antes da resolução do BES, o dinheiro parqueado nas Ilhas Virgens Britânicas quase quintuplicou. Os portugueses tinham lá mais de 600 milhões de euros nessa altura.

A lista negra do fisco que define quais são os paraísos fiscais foi criada apenas em 2004 e atualizada duas vezes: uma no final de 2011, pelo então ministro Vítor Gaspar (quando Luxemburgo e Chipre deixaram de constar da lista do fisco, que transpõe a Convenção da OCDE). E outra, no final do ano passado, já pela mão de Mário Centeno, que fez sair as ilhas de Jersey, de Man e Uruguai da lista.

Onde e quem

Claro que o rol dos paraísos construído a partir dos dados do FMI tem limitações, mas dá para perceber para onde tem ido muito do dinheiro dos portugueses, quais os territórios preferidos e que tipo de entidades detém o capital nesses offshores.

Quando o Luxemburgo ainda estava na lista (antes de 2011), este rivalizava com as Ilhas Caimão. O Luxemburgo, que é da zona euro mas tem um estatuto muito privilegiado, fiscalmente competitivo e central na captação de recursos financeiros (crédito), manteve o seu estatuto, mas as Caimão não perderam gás, mantendo fundos superiores a três mil milhões de euros desde o início de 2015. O segundo lugar pertence agora a Hong Kong (que antes não aparecia), com 181 milhões lá parqueados no final de junho de 2016. Em terceiro está Jersey, com 166 milhões de euros.

Quase 80% do dinheiro português em offshores pertence a bancos, seguradoras e fundos de pensões. Os particulares, que até 2013 não reportavam patrimónios, tinham 234 milhões de euros. As empresas não financeiras só declararam 82 milhões ao FMI.

Acções do Banif passaram por seis offshores

Quinta-feira, Setembro 3rd, 2009

Citamos

Expresso

Estado angolano quer €100 milhões, sem contar com dividendos.

Os cerca de 8,58 milhões de acções do Banif que foram compradas entre 1994 e 2000, alegadamente a mando do Estado angolano, passaram por seis sociedades sediadas em paraísos fiscais (offshore).

A identificação dos proprietários das offshores, assim como a determinação do percurso dessas sociedades, têm-se revelado um dos maiores constrangimentos da denúncia que está pendente na Procuradoria-Geral da República (PGR) e por via da qual o Governo angolano pretende recuperar um montante superior a €100 milhões, ao mesmo tempo que exige a punição das pessoas responsáveis pela burla qualificada de que diz ter sido alvo.

Angola diz, na denúncia apresentada à PGR, e que ainda está a ser analisada, que entregou aquele dinheiro a três testas-de-ferro em Portugal para comprarem uma participação significativa de até 49% do Banif, na década de 90.

As acções foram sendo compradas ao longo dos anos mas nunca lhe foram entregues. E o dinheiro que transferiu desapareceu. Inicialmente o negócio terá sido combinado entre o Estado angolano e um dos denunciados, o advogado Francisco Cruz Martins, a quem posteriormente se juntaram os empresários António Figueiredo e Eduardo Capelo Morais.

O Expresso noticiou na sua última edição que Angola transferiu pelo menos €67 milhões para tomar uma “participação relevante” no Banif. Este foi o valor entregue, numa primeira fase, através de várias transferências em dólares feitas para sociedades offshore e de direito português. Contudo, numa segunda fase foram feitas novas transferências, perfazendo cerca de €100 milhões. A este valor poderá ainda ser acrescentado, para a determinação do dinheiro a exigir por Angola, o montante dos dividendos que deviam ter sido distribuídos ao longo dos anos, correspondentes às acções compradas.

O escritório que tem neste momento em mãos o processo – a sociedade de advogados Amaral Blanco, Portela Duarte & Associados -, através dos advogados José Ramada Curto e Paulo Amaral Blanco, confirma que está a trabalhar no assunto mas recusa fazer comentários.

Já a PGR refere que “o processo está em investigação e corre termos com diligências a realizar”, acrescentando que “está em segredo de justiça, pelo que não é possível prestar mais esclarecimentos”. Segundo avançou a “Sábado”, já terão sido ouvidos pela PGR seis representantes do Estado angolano.

A perplexidade em torno deste tema é grande. Como foi possível que só há um ano o Governo angolano se tenha apercebido de que afinal não tinha as acções para cuja compra mandatara três portugueses? E só se apercebeu disso quando alegadamente Cruz Martins lhe apresentou uma conta de €19,5 milhões por serviços prestados? E se Cruz Martins desviou o dinheiro, por que ia a seguir ‘levantar a lebre’, pedindo honorários por um crime que quereria naturalmente esconder?

A explicação para que só agora o Estado angolano tivesse percebido o que aconteceu é dada por fontes angolanas – a desestruturação que o país sofreu enquanto esteve em guerra civil, conflito que terminou há sete anos.

Sobre a sua actuação, Cruz Martins deixou no ar, em declarações ao Expresso na semana passada, a ideia de que se poderia estar a querer atirar as culpas para a pessoa errada, “desviando as atenções de outras coisas”.

Outra questão que está em aberto diz respeito a quem, em Angola, ficou com a responsabilidade de controlar este negócio. O Expresso sabe que foram três as pessoas que inicialmente terão sido mandatadas em 1994 para representar o Estado angolano no acordo de compra das acções. São elas Generoso de Almeida, à data governador do Banco Nacional de Angola, António Van Dunen, à data secretário do Conselho de Ministros de Angola, e Paixão Franco, que foi assessor de José Eduardo dos Santos para os Assuntos Económicos e Sociais.

Angola já terá feito saber que irá até às últimas consequências neste caso, que pretende que seja “exemplar”.

PROTAGONISTAS

Francisco Cruz Martins

O advogado da Legalworks que terá sido mandatado pelo Estado angolano em 1994 para comprar até 49% do Banif representou duas sociedades accionistas do banco (Rentigest e Invesras) e fez parte dos órgãos sociais do banco até 2000. Ao Expresso não confirmou nem desmentiu qualquer contrato com Angola.

António Figueiredo

O tenente-coronel também figura como representante de uma das sociedades que detinham acções do Banif, a Sopar, e nesse contexto também fez parte de órgãos sociais do Banif até 2000. Foi impossível contactá-lo, por motivos de saúde.

Eduardo Capelo Morais

Foi representante da Invesras e fez parte dos órgãos sociais do Banif até 2000. O empresário não quer comentar o assunto.

Horácio Roque

O maior accionista do Banif terá vendido algumas acções às sociedades que os três accionistas representavam. Ao Expresso disse que só há um ano soube que estes accionistas representavam o Estado angolano.

Generoso de Almeida

Era em 1994 governador do Banco Nacional de Angola e terá sido um dos representantes do Estado angolano no negócio para a compra das acções do Banif. Esteve no Banco de Comércio e Indústria, foi deputado e hoje gere as suas empresas.

Paixão Franco

Outro dos representantes do negócio do lado do Estado angolano, foi assessor do Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, há cerca de 10 anos. Hoje é presidente do Banco de Desenvolvimentode Angola.

António Van-Dunem

Era secretário do Conselhode Ministros do Governo de Angola, cargo que ocupou durante vários anos e de que foi afastado há dois anos. Em causa terá estado, segundo a imprensa angolana, uma zanga com o chefe da Casa Civil do Presidente e problemas com créditos chineses.