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“Interesse nacional não foi bem acautelado” no Banif, diz Luís Amado

Segunda-feira, Março 27th, 2017

Citamos

Observador

 

Luís Amado, último presidente do Conselho de Administração do Banif, diz que houve, “claramente”, um “apoio a uma instituição ibérica” para que comprasse o Banif — numa referência ao Santander.

Luís Amado, último presidente do Conselho de Administração do Banif, diz que houve, “claramente”, um “apoio a uma instituição ibérica” para que esta comprasse o Banif — numa referência ao Santander. Em entrevista ao Jornal de Negócios e Antena 1, o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros diz que o interesse nacional “não foi bem acautelado” nesse processo e, também, na resolução do Banco Espírito Santo — Luís Amado fala em “experimentação” para desenhar a União Bancária europeia.

“No contexto da União Bancária, o rolo compressor desta, a partir do momento em que entrou em vigor a parte mais recente da legislação, a pressão das instituições europeias sobre a visão das instituições nacionais foi muitíssimo grande”, diz Luís Amado, defendendo que “a arquitetura do sistema bancário europeu foi desenhada em grande parte à revelia dessa visão do interesse específico nacional.

No caso português pareceu-me evidente, até porque houve situações de experimentação no caso português, em grande parte no BES e mesmo no Banif. Situações que serviram de referência para o próprio processo de avanço da União Bancária”.

No caso do Banif, que Luís Amado viveu de perto, o interesse “não foi bem acautelado, se tivermos em consideração a grande exposição que as duas Regiões Autónomas tinham com o Banif, especificamente a quota de mercado que aí representava e o que representou neste caso a cedência do Banif naquele contexto, aos interesses de uma visão do conjunto europeu. E que prevaleceu, no fim do processo, claramente de apoio a uma instituição ibérica”.

No Banif e no BES, a resolução foi boa opção? Havia alternativa? “Eu não sei se havia alternativa, sinceramente. Porque é preciso estar na posição de negociação que não era a minha, a posição de confronto direto com as instituições europeias. Agora acho que do ponto de vista dos interesses nacionais não foram as boas opções”, defende Luís Amado.

O ex-ministro dos Negócios Estrangeiros comentou, também, o cumprimento da meta do défice, lembrando que a Comissão Europeia fez pressão, antes do verão, para que o Governo aumentasse a disciplina na execução orçamental. “O défice de 2016 em grande parte foi conseguido com um corte grande no investimento público e por antecipação de dívidas ao Estado”, diz Luís Amado, alertando que “os problemas estruturais continuam lá todos” e uma dia acabará o “efeito anestesiante” dos estímulos do Banco Central Europeu (BCE).

Os problemas estruturais subsistem e subsistirão, até porque é muito difícil numa fórmula de governo minoritário, com os constrangimentos a que este Governo está sujeito, conciliar as expectativas de curto prazo com as exigências estruturais de médio e de longo prazo”.

Os milhões pe(r)didos do Banif

Quinta-feira, Junho 2nd, 2016

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Expresso

Das guerras familiares às complexas engenharias financeiras, dos processos judiciais aos milhões que se evaporaram, o colapso do Banif foi investigado durante vários meses pela SIC, que transmite esta quarta-feira o segundo dos três episódios desta reportagem

O altar das Sete Cidades, nos Açores, é quase sempre lugar de bruma. ‘Bruma’, ‘nevoeiro espesso’. Poderia ser este o subtítulo da tormenta que aí vem.

O Hotel Monte Palace é hoje propriedade da Oitante, o veículo público que ficou com os ativos não financeiros do Banif. Bons e maus.

O empresário que o comprou financiou-se no Banif. Custou – já muito rasgado por dentro e por fora – 2 milhões de euros.

Um grupo árabe esteve quase a comprá-lo ao Banif por 380 mil euros, um sexto do valor do crédito. Ainda o Banif era Banif.

Os árabes não compraram. O imóvel repousa agora numa imobiliária local. À venda por 1 milhão, 550 mil euros. Não saiu por 380 mil euros. Sairá por 1 milhão, 550 mil?

O visionário promotor imobiliário que adquirira o hotel recorrera ao crédito fácil do banco de Horácio Roque, de onde, no calor dos anos noventa, jorravam milhões para imobiliário. O empresário não pagou os dois milhões e devolveu o imóvel. A dívida foi extinta.

Sílvio Santos é hoje um viajante. Está momentaneamente em Portugal a organizar a semana cultural da Rússia. Percorre parcelas significativas do globo, da Rússia ao mundo lusófono, com largas paragens no novo membro da CPLP, a Guiné Equatorial.

A entrada do país na Comunidade de Países de Língua Portuguesa, formalizada em 2014, coincide no tempo com o anúncio de que duas empresas públicas do país, liderado há mais de três décadas pelo ditador Teodoro Obiang, se preparavam para investir no Banif. A Guiné Equatorial aderiu à comunidade, mas o dinheiro de Obiang nunca chegou ao banco português.

Quando Luís Amado, ex-Ministro dos Negócios Estrangeiros, utilizou todo o seu poder diplomático para fazer a ponte entre os cofres vazios do banco e o dinheiro de Obiang, sabia ao que ia. Era uma solução de “emergência”, admite.

A adesão da ditadura de Teodoro Obiang à Comunidade de Países de Língua Portuguesa forçou a integração do português na lista de línguas oficiais.

Como ninguém fala português no território, gerido há três décadas pelo mesmo homem, o novo negócio do empresário Sílvio Santos tem tudo para prosperar.

O Monte Palace é apenas uma pequena parcela do sonho de Sílvio Santos.
Tudo somado, o empresário foi à banca buscar 130 milhões de euros. 100 milhões vieram diretamente do Banif.

Ponta Delgada está carregada de sonhos de Sílvio Santos, que se tornaram pesadelo para o banco de Horácio Roque.

Os esqueletos de betão do promotor imobiliário passaram para o banco quando o crédito que os alimentava deixou de ser pago. A entrega extinguiu a dívida.

Hoje são ativos não financeiros a cargo do veículo público Oitante, e à espera de quem os compre por valores muito abaixo do montante emprestado.

Sílvio Santos prefere, contudo, acreditar no poder da multiplicação para rejeitar a ideia de que os 130 milhões de euros cairão, um dia, no bolso dos contribuintes. “Hoje não valem 130, valem 80 ou 30 ou 50. Talvez daqui a dez anos valham 150”, arrisca.

Contas visionárias. Se daqui a dez anos as ideias de Sílvio Santos derem fruto, será um outro visionário a lucrar.

Com a resolução do Banif, o país assumiu de rajada os prejuízos. O património não financeiro do banco, que o Santander não quis, entrou nas contas da Oitante com um corte de 66% face ao valor da ultima avaliação que, por sua vez, já refletia as desvalorizações de um mercado imobiliário em queda.

Ou seja, quem comprar os esqueletos de Sílvio Santos e de todos os visionários que se financiaram no Banif, irá comprá-los, na melhor das hipóteses, por um terço do valor do crédito. Bom negócio, de facto, só se for para quem compra.

A empresa que contratou Maria Luís Albuquerque como administradora não executiva é, entre muitas outras, especialista nestas lucrativas compras em pacote.

Nos anos de ouro do dinheiro fácil, os bancos financiavam as ideias dos promotores imobiliários, sem cuidarem se as mesmas seriam, ou não, concretizadas. A esse respeito, o Banif era especialmente flexível.

Na Comissão Parlamentar de Inquérito ao Banif, António Varela – que deixou a administração do banco de Horácio Roque para integrar a supervisão do Banco de Portugal – cargo que viria também a abandonar, declarou que o a instituição tinha “uma elevadíssima exposição ao imobiliário com critérios muito duvidosos de afirmação dessa mesma concessão de crédito”.

Declaração que o antigo número dois de Horácio Roque, Joaquim Marques dos Santos, contrapõe. “Toda a concessão de crédito se baseia num regulamento que é um regulamento bem rígido.”
Menos transparente é a prática revelada à investigação da SIC por um antigo funcionário do banco que admite que o Banif procedia à manipulação de contas.

Para o comando executivo do Banif é escolhido Jorge Tomé, que transita da Caixa Geral de Depósitos.

Em 2012 a banca portuguesa estava descapitalizada. O Banco Central Europeu era a boia de salvação da maioria. Mas a dependência que o Banif tinha do BCE era estratosférica. “2,8 mil milhões de euros” avançou Jorge Tomé à Comissão de Inquérito.

Mesmo dando lucros o Banif afundava-se numa tragédia em cadeia que ninguém detetou a tempo.

As necessidades de liquidez assumidas pelo, à época, Presidente do banco têm três razões:

1) A operação da marca no Brasil que correu inicialmente bem mas que conduziria a perdas de 267 milhões de euros nas contas consolidadas do grupo;

2) O ardiloso esquema dos empréstimos cruzados, que serviu para iludir o regulador e para abrir a torneira do crédito às empresas do grupo.

António Varela chegou a sugerir à Comissão Parlamentar de Inquérito que “havia uma coisa que podia ser feita que era o Banco Espírito Santo emprestar dinheiro à família Roque e, em contrapartida, o Banif emprestar dinheiro à família Espírito Santo”.

No Banif, a abertura da torneira do crédito às empresas do grupo atingiu um caudal de 195 milhões de euros, sem que as empresas ajudadas tivessem de dar fosse o que fosse como garantia;

3) A obsessão do banco pelo imobiliário. Em 2012, o crédito em incumprimento no Banif rondava os 1400 milhões de euros. A maior parcela estava relacionada com a aposta no imobiliário. Entre 2012 e 2015 o imobiliário deixou rasto nas contas do banco. “360 milhões de euros de perdas, entre desvalorizações e ajustamentos de valor e vendas”, calcula Jorge Tomé.

‘Ajustamentos’, ‘desvalorizações’, eufemismos que entraram no léxico do empresário Sílvio Santos. Financiou 100 milhões de ideias e de projetos no Banif. Ruíram. O banco ficou sem o dinheiro, mas recebeu em troca as ideias e os projetos.

Sílvio Santos acreditou que o turismo residencial seria o futuro dos Açores. Comprou solares, que haveriam de ser centros de atração de segundas, terceiras habitações destinadas, sobretudo, a ingleses e irlandeses.

Associou à maquete o golfe. Em 2006, chegou a acordo com o Governo Regional e tomou conta da empresa “Verde Golf”, a entidade pública criada para explorar as diversas dimensões deste desporto. É o único dos negócios de Sílvio Santos com o Banif que ainda resiste.

O financiamento, hoje já em 20 milhões de euros, está, todavia, em incumprimento. A conta é gerida pela Oitante, que ficou com tudo o que o Santander não quis.
Nesta fase, Sílvio Santos, prepara um plano de recuperação do projeto, para apresentar aos credores.

O maior investimento do grupo SIRAM foi, todavia, na ilha de Porto Santo, o “Colombos Resort”.

A frente de mar, em estado selvagem, conquistou Sílvio Santos, Góis Ferreira e Joaquim Coimbra. Os três sócios, através das ‘holdings’ que lideravam, adquiriram 140 mil metros quadrados de terrenos privados, numa linha de terra de 500 metros, paralela à costa. Conseguiram fazer aprovar na autarquia um plano de urbanização que abriu a porta à construção de hotéis, apartamentos turísticos, vilas de luxo, áreas de lazer e um casino. Financiaram-se no BCP – 35 milhões; no Banif – 35 milhões; e no BPN – 30 milhões.

O projeto parou em 2009. A sociedade faliu. Os créditos não foram pagos. Os bancos ficaram com o património. Uma parte foi construída, outra ficou a meio, o resto é terreno em bruto.

Mas também aqui o empresário Sílvio Santos garante que nada se perde. Ainda que o investimento inicial se possa vir a transformar numa ínfima parte daquilo que foi. “Se de 2006 para 2016 a propriedade tem outro valor isso resulta da lei da oferta e da procura”, esclarece.

DO FUNCHAL AO ‘AFANISTÃO’

Pedro Calado fora vereador durante o período em que Miguel Albuquerque liderara a Câmara Municipal do Funchal.

Até à véspera da posse do Governo Regional, que Albuquerque hoje lidera, Calado era o número dois.

À última hora saiu de cena e fixou-se no Grupo AFA, o maior grupo de construção civil da Madeira e um dos maiores do país.

O crescimento rápido da ilha dependeu, em grande medida, da vontade do Governo Regional em fazer obra, da ampla liquidez do Banif e da capacidade de resposta do grupo AFA, que fazia a obra e a cobrava. “Foi um triângulo positivo que fez com que tivéssemos chegado onde chegámos”, admite o ex-vereador.

“Uma das arestas do triângulo não teve tanta sorte, o Banif”, Pedro Calado Deixou o cargo de vereador da Câmara do Funchal para integrar a direção do grupo de construção ‘AFA’.

Piloto, Carlos Saraiva vivia nas nuvens. Projetava, construía e geria os hotéis que inaugurava país fora, Continente e Madeira.

Pequeno pormenor. O dinheiro que investia não era dele mas de centenas de fornecedores e dos depositantes dos bancos: BES, BCP, Banco Popular e Banif. Saraiva soube distribuir o risco. No total, foi buscar mais de 1000 milhões de euros.

Carlos Saraiva na Grande Reportagem "Ensaio sobre o luxo" exibida na SIC FOTO CARLOS SANTOS

Carlos Saraiva na Grande Reportagem “Ensaio sobre o luxo” exibida na SIC FOTO CARLOS SANTOS

DR

Só um ano depois deste ensaio sobre o luxo, é que os bancos e os fornecedores que financiaram Carlos Saraiva percebem que tinham sido protagonistas de um ensaio sobre a cegueira.

Em 2012, os bancos assumem o controlo e a gestão dos ativos do império CS.
Em 2013 as empresas de Carlos Saraiva submetem-se a um plano especial de revitalização.

E eis chegado o momento dos fundos de recuperação. Para se libertarem de um negócio que não lhes pertence, os bancos venderam o património de Carlos Saraiva à ECS Capital.

No final de 2014, a ECS criou uma marca chapéu para dez hotéis que eram de Carlos Saraiva, a ‘Nau, Hotels & Resorts’. O negócio, comprado em saldo e libertado do peso das dívidas, voltou a gerar receita.

Carlos Saraiva, que abrira as portas da SIC ao ensaio sobre o luxo, fechou-as a este ensaio sobre a cegueira.

Saraiva deixou apeados fornecedores e carregou negativamente no balanço dos bancos.

A queda do BES e do Banif, que direta ou indiretamente o país tem de pagar, foi feita destes empreendedores visionários.

Um aeródromo de 30 milhões em Ponte de Sor

Nos 1850 metros de pista do aeródromo de Ponte Sor podem aterrar e levantar os Air Bus A320 ou os Boeing 737. Podem, mas não aterram, nem levantam.

O projeto custou cerca de 30 milhões a uma autarquia com cerca de 17 milhões de orçamento anual.

Hugo Hilário, Presidente da Câmara de Ponte de Sor, dispara o argumento dos postos de trabalho para explicar a aposta milionária. “Até ao momento já aqui trabalham 200 pessoas e ate ao verão mais 100”, justifica. Ou seja, no aeródromo de Ponte de Sor cada posto de trabalho efetivo custou 150 mil euros.

A maior empresa do aeródromo é a escola de pilotos, propriedade do grupo ‘G AIR’. O cérebro chama-se Carlos Saraiva.

Depois do ‘percalço’ de 1000 milhões de euros nos hotéis, o empresário regressou às nuvens.

Lá, onde viaja Sílvio Santos – 130 milhões de euros depois, Joaquim Coimbra, Emídio Catum, Aprígio Santos, o irmão Cavaco, e todos os que abriram buracos nos bancos que perderam o norte, nunca evidenciaram sinais exteriores de pobreza.

 

Banif, a receita de um desastre

Quinta-feira, Abril 14th, 2016

Citamos

Negócios Opinião RUI PERES JORGE

Quase dez anos após o início da crise, o livro das regras de funcionamento bancário continua a ser escrito e reintrepretado, confirmando que a banca abusou, cresceu demais, e continua a ameaçar o nosso futuro, como prova o Banif.

Misture complacência da troika e das autoridades nacionais durante os dois primeiros anos para com o sistema financeiro, junte a confusão gerada por um desastre bancário chamado BES e reserve. No terceiro ano, durante os primeiros 11 meses, envolva lentamente várias pitadas de cálculo eleitoral, incluindo a decisão sobre a recondução na liderança do banco central. Termine com um choque inédito de perda de soberania nacional sobre o sistema bancário. O resultado, já imagina, é uma factura de mais de três mil milhões de euros paga pelos contribuintes para garantir a estabilidade do sistema financeiro português, com a subsequente entrega do banco a um gigante espanhol a mando de Bruxelas e Frankfurt.

Esta é, traços largos, a receita do desastre chamado Banif que continua a ser investigada pela comissão parlamentar de inquérito. Há ainda muita informação a recolher e a analisar, mas entre as cartas e as informações já divulgadas, e as audições de Jorge Tomé, António Varela e Carlos Costa, Mário Centeno e Maria Luís Albuquerque é já possível tirarmos algumas conclusões.

A História dá conta de uma aflitiva incapacidade de Jorge Tomé, Luís Amado e Maria Luís Albuquerque em reestruturarem o banco fundado por Horário Roque, um falhanço claro face ao objectivo que assumiram no final de 2012.

A seu favor, gestores e accionistas têm a difícil situação em que o banco se encontrava e o contexto económico e financeiro que o país atravessou, agravados pelo desastre do BES no Verão de 2013. É difícil, no entanto, compreender que tenham protelado o problema até não haver mais tempo.

O Banif ficará por isso para a História como mais um exemplo da complacência do Governo, da troika e do Banco de Portugal em limpar e recuperar o sector financeiro durante o programa de ajustamento. Nem mesmo instituições geridas por famílias que indiciavam colocar os bancos ao serviço dos respectivos grupos económicos motivaram actuações das autoridades. Não é demais lembrar que BES e Banif rebentaram após a saída limpa do programa em Junho de 2014, a qual deixou nos cofres públicos 6,4 mil milhões de euros, e nos balanços dos bancos mais de 20 mil milhões de euros crédito malparado – um problema que nos continua a perseguir.
Pior, em 2015, há indícios de que cálculos eleitorais adiaram uma acção mais enérgica por parte do Governo, possivelmente com a conivência do governador do Banco de Portugal que foi reconduzido no cargo nesse ano, apesar do desastre no BES e da oposição dos três partidos que vieram a formar Governo meses depois.
Finalmente, na dimensão nacional, o caso Banif evidencia ainda a fragilidade de Carlos Costa que, desde 2014, viu a sua credibilidade manchada pelo desastre no BES, ao mesmo tempo que a união bancária europeia transferia muito do seu poder para Bruxelas e Frankfurt. O homem que chegou a ser falado para líder de um governo de salvação nacional acabou a permitir que mais um banco à deriva se afundasse numa corrida aos depósitos.
Mas o Banif é ainda interessante em duas outras dimensões que se afirmaram já com o novo Governo e com a resolução e venda do Banif ao Santander.

O episódio exibe, por um lado, o grau de cedência de soberania para Bruxelas e Frankfurt – a maior desde a perda do escudo – que resulta da união bancária. Sendo claros, BCE e a Comissão Europeia decidiram o futuro de um banco contra a vontade do Governo, entregando-a a capital espanhol, e fizeram-no usando dinheiro dos contribuintes portugueses, não prestando as devidas explicações no Parlamento.

Por outro lado, mostra a desconfiança europeia em relação às novas regras europeias de resolução de bancos, criadas para defender os contribuintes com a promessa de impor antes perdas a obrigacionistas e depositantes acima de 100 mil euros. A verdade é que nem o Governo de António Costa, nem o BCE, nem a Comissão Europeia quiseram experimentar a liquidação do banco, ou as novas regras.
Ricardo Mourinho Félix, o novo secretário de Estado, num exercício de transparência que deve ser destacado, escreveu recentemente a perspectiva do Governo, defendendo, com números, que a resolução foi melhor do que a liquidação. Falta explicar e debater por que razão entendeu que gastar três mil milhões de euros dos contribuintes foi preferível a queimar 2,8 mil milhões de euros dos depositantes não seguros.

O actual Governo argumenta com os efeitos devastadores para a confiança no sistema financeiro português e para as economias da Madeira e dos Açores. Se assim é, somos forçados a concluir que mesmo um banco que pesava 6% no PIB português e 0,1% da Zona Euro pode ser demasiado grande para falir ou para impor perdas aos obrigacionistas e depositantes – a ponto de forçar um aumento significativo da dívida pública de um país já muito endividado.
Quase dez anos após o início da crise, o livro das regras de funcionamento bancário continua a ser escrito e reintrepretado, confirmando que a banca abusou, cresceu demais, e continua a ameaçar o nosso futuro.

Em direto/ Luís Amado. Bruxelas tinha preconceito de raiz contra o Banif que levou até às últimas consequências

Quarta-feira, Março 30th, 2016

Citamos

Observador Acompanhe aqui a Comissão de Inquérito

Banif, lavandaria da ditadura Obiang

Sexta-feira, Fevereiro 21st, 2014

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Esquerda Net Opinião

A entrada da Guiné Equatorial no capital do Banif é um reencontro com Luís Amado, atual chairman do banco e ex-ministro dos negócios estrangeiros apoiante do regime ditatorial de Obiang.

Para o presidente do Banif, a entrada da Guiné Equatorial no capital do banco, seria um “reencontro com a História de Portugal”. Na verdade, é um reencontro com Luís Amado, atual chairman do banco e ex-ministro dos negócios estrangeiros apoiante do regime de Obiang. O ditador é um pária internacional e o seu filho tem mandato de captura em Portugal.

Nos últimos 15 anos, a Guiné Equatorial deixou de ser apenas um dos últimos países da lista de desenvolvimento humano para se tornar no “Koweit africano”, com relações comerciais com todas as grandes potências, chegando a terceiro produtor de petróleo e gás no continente, atrás da Nigéria e de Angola. Isso não mudou a estrutura social do país, que continua afundado na pobreza endémica e com uma esperança média de vida de 51 anos. O círculo do poder concentra a acumulação da renda petrolífera, inspirado no regime de Angola que é, desde a queda de Khadafi, o seu principal parceiro político internacional.

O filho do ditador, seu anunciado sucessor e já proclamado vice-presidente, terá conseguido situar em bancos norte-americanos centenas de milhões de dólares, entre eles o Banco Riggs, que também albergava Pinochet e que terminou encerrado pela Justiça. Uma investigação conduzida pelo Senado norte-americano revelou em 2004 que a família de Obiang tinha recebido pagamentos de companhias como a Exxon Mobil ou a Amerada Hess. As petrolíferas dos EUA são as grandes beneficiárias das concessões da Guiné Equatorial, embora nos últimos anos se tenha acentuado a influência chinesa no país.

Em 2011, os tribunais norte-americanos ordenaram aapreensão de bens de luxo adquiridos por Teodorin Obiang, no valor de 70 milhões de dólares. Já em 2012, a justiça francesa emitiu um mandato de captura em seu nome, válido para toda a zona Schengen, pelo crime de apropriação indevida de bens públicos. Nessa altura, o recheio do luxuoso edifício dos Obiang na avenida Foch, em Paris, foi arrestado pelos tribunais franceses (na foto).

Há muito que o governo de Obiang se desdobra em operações de relações públicas, com o patrocínio de um prémio científico da Unesco e o pedido de adesão à Comunidade de Países de Língua Portuguesa. Até agora, a intenção lusófona do regime da Guiné Equatorial não se concretizou, demasiado bizarra e de pesado contorno político. Como assinalou Fátima Proença, da ONGD ACEP, “existe o risco de que a chamada comunidade da lusofonia se converta na petrofonia“.

Com o surto petrolífero, o regime de Obiang passou a acompanhar de perto as tomadas de posição do parceiro angolano na economia portuguesa, em particular na banca, essencial para a lavagem de fundos. É certo que a aplicação em Portugal de 133 milhões de euros, no quadro do aumento de capital submetido pelo Banif ao Banco de Portugal e à CMVM, poderá abrir algumas das portas que os Obiang rondam há muito, em busca de aplicações seguras para a riqueza extraída da Guiné Equatorial.

O facto de o vendedor desta “máquina de lavar” ser o próprio Estado português, que controla a maioria do capital do Banif desde que o resgatou, é a melhor garantia que Obiang pode ter. De resto, o atual chairman do Banif é um velho aliado do regime, o ex-Ministro dos Negócios Estrangeiros Luís Amado, que visitou Obiang em 2010 e afirmou na altura que a adesão da Guiné Equatorial à CPLP deveria ser encarada “com naturalidade e sem dramatização”. O processo só não se consumou sob o governo Sócrates graças à mobilização internacional, que juntou nomes como Basilio do Nascimento, de Timor-Leste, Frei Betto e Chico Buarque, do Brasil, Eduardo Lourenço, de Portugal, Justino Pinto de Andrade, de Angola, e Mia Couto, de Moçambique.

De facto, os laços históricos da Guiné Equatorial com o espaço da lusofonia são, no mínimo, remotos. O país inclui as ilhas de Fernando Pó, Ano Bom e Corisco, mantidas pela Coroa portuguesa desde o século XV e ao longo de trezentos anos como entreposto do comércio de escravos. Mas, em 1778, as ilhas foram entregues a Castela em troca da sua retirada da ilha brasileira de Santa Catarina e da demarcação de fronteiras na América do Sul. Em 1968, o franquismo reconhece a independência do pequeno país, de 750 mil habitantes e com um terço da superfície portuguesa, onde pouco mais deixou do que a língua castelhana. Desde 1979 que a Guiné Equatorial é governada por Teodor Obiang governa a Guiné Equatorial desde 1979, ano em que eliminou o seu antecessor e tio, Francisco Nguema. Em junho passado, Obiang foigalardoado com o prémio internacional Kim-Jong Il, “pelo seu compromisso com a justiça, o desenvolvimento, a paz e a harmonia”.

Em qualquer caso, este “reeencontro com a História de Portugal” não é de agora. Tem já mais de dez anos e aprofundou-se pela mão do coronel Khadafi, em finais de 2007, quando a Galp entrou em sociedade com o fundo soberano da Líbia para investimentos em explorações petrolíferas neste país e noutros seus vizinhos, entre eles a Guiné Equatorial. Até hoje, a Galp Energia detém uma participação de 15% na sociedade que construirá um segundo trem de liquefação de gás natural no país, caso sejam certificados volumes de gás natural que o tornem viável. O consórcio para o desenvolvimento deste projeto é composto ainda pela Sonagas (50%), empresa petrolífera nacional, a espanhola Union Fenosa (20%) e o governo da Guiné-Equatorial (15%).

Já em 2002 e 2003, o banco do Estado português, a CGD, financiava grandes contratos de exportação para a Guiné Equatorial, contratos em que se destacaram os cimentos da Secil e da Cimpor. Outros grupos portugueses com negócios na Guiné Equatorial são a Reditus, de Miguel Paes do Amaral, nas tecnologias da informação; a Teixeira Duarte, que apoiou em 2012 a portuguesa SD na construção do Instituto Tecnológico Nacional de Hidrocarbonetos e afirma contar com o negócio na Guiné Equatorial para se expandir nas áreas da Geotecnia e Fundações e nas Obras Marítimas.