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Negócios
A Rentipar caminha para a insolvência. A empresa liderada por Teresa Roque tem uma dívida acima de 50 milhões ao Novo Banco que não pagou. Não há “garantias especiais associadas” a esses créditos concedidos. BCP e Banif são outros credores.
DIOGO CAVALEIRO
O Novo Banco acelerou a insolvência da Rentipar Investimentos, a empresa presidida pela filha de Horácio Roque que exercia, antes da entrada do Estado em 2012, o controlo sobre o Banif.
No documento em que solicita a entrada em insolvência, a que o Negócios teve acesso, a Rentipar explica que o facto de não ter conseguido negociar a dívida que tinha perante a instituição sob o comando de Eduardo Stock da Cunha tornou “inegável a incapacidade da requerente em cumprir as suas obrigações contratuais”.
Em Outubro de 2015, a sociedade liderada por Horácio Roque quis renegociar o passivo que havia entrado em incumprimento meses antes umaparte era em papel comercial, subscrito em 2009 junto do BES, a outra em crédito concedido. Não conseguiu. Ficou com uma divida de 54,5 milhões de euros por reembolsar. E sob ameaças judiciais. “Não podendo este banco manter, por tempo indeterminado, as responsabilidades em causa nesta situação de incumprimento, vimos conceder o prazo de 10 dias para que nos apresentem uma proposta concreta de regularização, por forma a estudarmos em conjunto uma plataforma de solução. Não sendo possível, a curto prazo, encontrar uma solução, entregaremos o caso aos nossos advogados, a fim de sermos reembolsados pela via judicial”, indica a carta do departamento de recuperação de crédito do Novo Banco, citada nos documentos que deram entrada no Tribunal da Comarca de Lisboa.
“Não tem garantias especiais associadas”, é outra informação que consta relativamente tanto ao crédito, como ao papel comercial subscrito pelo Novo Banco.
A instituição herdeira do Banco Espírito Santo é apenas um dos quatro principais credores da Rentipar. Conta-se, nos documentos da Abreu & Marques e Associados, as dívidas de 13,4 milhões de euros perante o BCP e de 8,9 milhões junto do Banif. A maior porção é uma dívida sobre quem adquiriu as obrigações emitidas em 2011, de 60 milhões de euros. Foi a 2 de Novembro que a administração liderada por Teresa Roque percebeu que não tinha “perspectivas de continuidade da sua actividade”. O principal activo da Rentipar Investimentos é a participação na Rentipar Financeira, que era a accionista histórica do Banif. Só que, entre outros, a queda da cotação das acções desde a ajuda estatal de 2012 desequilibrou a situação patrimonial da companhia, já que deixou de dispor de activos para apresentar como colaterais em financiamentos.
Assim, seguiu-se a tentativa de venda de activos, como a participação no Banif. “Foram encetadas várias diligências tendentes à alienação do principal activo da sociedade, com especial enfoque no mercado chinês”, assinala a acta da reunião de 2 de Novembro. Tentativas “infrutíferas”, diz-se no documento. “Consideramos que não é possível assegurar a esta data que a empresa consiga cumprir com as suas responsabilidades de curto prazo e cumprir com o princípio de continuidade das operações”, aponta a certificação de contas de 2014, realizada pela PwC em Setembro de 2015, que se escusou a dar a sua opinião devido à desequilibrada situação da companhia. No final de 2014, com o prejuízo de 49,4 milhões de euros registado, a Rentipar Investimentos passou a apresentar capitais próprios (que, de forma simples, resultam da diferença entre activos e passivos) de 11,9 milhões de euros, “inferior a metade do capital social”, o que, segundo a lei, obriga ou à dissolução ou ao reforço de capital. Até agora, esse reforço não foi possibilitado e a intervenção no Banif agravou ainda mais a situação, dando a “última machadada”, como já havia dito fonte da sociedade ao Negócios.
Venda ao Totta por explicar
Vários partidos consideram que a venda da actividade bancária do Banif ao Santander Totta está por explicar. À direita, o PSD quer esclarecer notícias recentes. À esquerda, o PCP pretende conhecer o papel do Banco Central Europeu na queda do Banco. As forças parlamentares querem respostas imediatas e não esperam pela comissão de inquérito ao Banif, cuja discussão está marcada para 22 de Janeiro. “Confirma que houve ofertas privadas para a compra do Banif que implicariam menos esforço financeiro público do que a venda ao Santander?” é uma pergunta lançada ao ministro pelos comunistas Miguel Tiago e Paulo Sá, depois de o Público ter avançado que a Apollo tinha uma proposta de compra do Banif que implicava um menor esforço financeiro estatal do que a que vingou, do Totta. O crédito fiscal que pode superar os 200 milhões que passou do Banif para o banco de capitais espanhóis é outra preocupação. O PCP, através de João Ferreira, levou também o caso ao Parlamento Europeu para que se questione a Comissão Europeia sobre a sua intervenção na resolução do Banif. Já o PSD quer que Mário Centeno preste declarações, com “urgência”, na comissão parlamentar de Orçamento porque, disse o deputado António Leitão Amaro, as recentes notícias são ” muito preocupantes para os contribuintes”.
NÚMEROS
Os credores da Rentipar Investimentos
A empresa presidida por Teresa Roque tem quatro grandes credores, segundo os papéis da insolvência que deram entrada na Comarca de Lisboa.
60 MILHÕES DE EUROS
Valor da emissão, de 2011, de obrigações da Rentipar Investimentos, cuja maturidade é em Dezembro de 2016.
50 MILHÕES DE EUROS
Papel comercial do Novo Banco em que a Rentipar está em incumprimento. Junta-se mais de 1 milhão em crédito.
13,45 MILHÕES DE EUROS
Dívida da Rentipar Investimentos perante o BCP, em que as acções do Banif foram dadas como garantias.
8,9 MILHÕES DE EUROS
Um financiamento intra-grupo do Banif à Rentipar, cujas garantias prendem-se a participações em outras empresas. Rentipar colocou obrigações após perder dividendo
O Banif deixou de pagar dividendos e, no ano seguinte, a empresa-mãe avançou para uma colocação de obrigações que envolveu clientes do banco. A devolução está em risco.
A Rentipar deixou de receber dividendos do seu principal activo, o Banif, em 2010. Nessa altura, começaram também a agravar-se os problemas naquela instituição financeira, acompanhando todo o sistema financeiro. Mas a empresa da filha de Horácio Roque precisava de se financiar. A opção foi uma emissão de obrigações. Sem dinheiro do banco, a Rentipar acabou por conseguir financiar-se, em parte, com dinheiro dos clientes da instituição financeira.
Em 2011, foram colocados 60 milhões de euros em obrigações. Algumas, não se sabe quantas, foram vendidas aos balcões do banco sediado no Funchal, como adiantou o Económico. A emissão podia ser subscrita por particulares, já que o valor mínimo de subscrição era 50 mil euros por papel. A data original para o vencimento dos títulos era 2013 mas não houve condições para que tal acontecesse na data – a Rentipar teve de assumir um compromisso com o Estado, no âmbito da ajuda estatal de 2012, que implicava um investimento de 75 milhões de euros no Banif. Assim, a maturidade foi estendida até 2016, altura em que o grosso da ajuda estatal do banco já estaria devolvido, e poderia haver já uma situação mais equilibrada na accionista. Não aconteceu. O Banif nunca conseguiu recuperar-se efectivamente e, no final de 2015, acabou por ser intervencionado, com a actividade bancária a ser vendida ao Santander Totta.
Os títulos da Rentipar arriscam a não devolução. Havia uma possibilidade de reembolso antecipado do capital investido nestas obrigações a 30 de Dezembro de 2015, mas a SIC avançou que a empresa não permitiu tal adiantamento. Da mesma forma, também a estação de televisão adiantou que há juros em atraso.
Tal como o Negócios já deu conta, o representante comum dos obrigacionistas agendou já uma reunião para 22 de Janeiro, de forma a obter autorização para reclamar os créditos “na eventualidade de vir a ser declarada a insolvência da Rentipar Investimentos”. Antecipam-se ainda outro tipo de acções que visem a recuperação.