Archive for the ‘Dívida Pública’ Category

O Northern Rock e o Banif

Domingo, Junho 12th, 2016

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Dinheiro Vivo Ricardo Reis Banif

Só em Portugal é que cresceu tanto a tese de que a TVI devia ser condenada. Inglaterra tem maior tradição de respeito pela liberdade de imprensa

As comissões de inquérito na Assembleia da República têm um papel na construção da história. O relatório sobre o Banif, por exemplo, será o ponto de partida quando no futuro se estudar o que aconteceu. Pode por isso ser útil lembrar uma história recente: o colapso do Northern Rock no Reino Unido em 2007. Tal como Banif, o Northern Rock não era um dos maiores bancos do seu país.

Tal como o Banif, ele tinha crescido rapidamente, assente numa estratégia com dois pilares. Do lado dos créditos, o Northern Rock especializava-se em hipotecas, em grande expansão no início do século. Do lado dos débitos, tinha uma forte presença online e a maioria dos seus depositantes usava o website para fazer as suas operações bancárias. Já o Banif cresceu à conta do sector da construção civil e dos depósitos dos emigrantes açorianos.

Tal como no Banif, os problemas do Northern Rock começaram com uma crise externa – o subprime americano no caso do banco britânico, a crise da dívida pública no caso do banco madeirense. Tal como o Banif, o Northern Rock foi primeiro gerido pelo Estado durante uns anos e por fim vendido a outro banco em 2012. Os antigos gestores, quer do Northern Rock quer do Banif, ainda hoje acham que com mais algum tempo e uma pontinha de sorte teria acabado tudo bem. No entanto, o Northern Rock precisou de ajuda.

A 14 de setembro de 2007, o Banco de Inglaterra comunicou aos media que tinha aberto uma linha de crédito ao banco. As autoridades concluíram que, com esta ajuda para resolver problemas de curto prazo, o Northern Rock estaria sólido. Só que, nas redações, os jornalistas receberam a novidade de outra forma. Nas notícias dessa noite, a ajuda do Banco de Inglaterra foi descrita não como uma solução, mas antes como um diagnóstico de que se confirmavam problemas. Tal como nos rodapés da TVI sobre o Banif, o tom e a forma como saiu a notícia fez muita diferença. Assustados, alguns depositantes ligaram-se à internet para transferir o seu dinheiro.

Só que quem desenhou o website do Northern Rock não acautelou ter tantas pessoas num curto de espaço de tempo a fazer transferências. O website entrou em crash e não funcionou durante a noite. Milhares de pessoas, incertas com a notícia dos media britânicos, foram à internet verificar e viram o website em baixo. Convenceram-se de que havia mesmo problema, ao contrário do que diziam as autoridades. Na manhã seguinte, estava uma fila à porta da agência do Northern Rock. Num espaço de horas, o website voltou a estar online, as portas do banco abriram, e saíram tantos milhares de milhões que o banco não sobreviveu.

Tal como no Banif, oito anos depois. Os responsáveis do Northern Rock culparam os media e os informáticos pela sua miséria, tal como os responsáveis do Banif culparam a TVI e os reguladores. Mas só em Portugal é que cresceu tanto a tese de que a TVI devia ser condenada pela comissão de inquérito, violentamente censurada na opinião pública, e multada pelo regulador. A Inglaterra tem uma tradição de respeito pela liberdade de imprensa e de combate à censura que nós ainda não temos.

Professor de Economia na Universidade de Colúmbia, em Nova Iorque

Já não há Banco de Portugal

Domingo, Maio 29th, 2016

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A Estátua do Sal Opinião Nicolau Santos in Expresso Diário 27/05/2016

Cada vez é mais evidente que o Banco de Portugal já não é o Banco de Portugal, mas uma agência do Banco Central Europeu, que atua por ordens de Frankfurt e que, quando decide pela sua cabeça, desculpa-se depois com as ordens que supostamente vêm de fora. Os exemplos já são muitos mas hoje surgiu mais um.

Pelo seu estatuto orgânico, o Banco de Portugal apenas obedece ao BCE. O governador é inamovível e não pode ser demitido pelo Governo, a não ser no caso de falha grave (mas até agora nunca tal aconteceu em nenhum país da União Europeia). E quando o país foi obrigado a cortar duramente em salários e reformas, os funcionários do Banco de Portugal mantiveram-se olimpicamente “a latere” desse esforço.

A primeira grande confusão veio, contudo, com a resolução do BES. Supostamente, o BCE decidiu exigir num fim-de-semana uma linha de crédito de três mil milhões concedida ao banco e impedir o seu acesso para se refinanciar junto do Eurosistema. O Governo PSD/CDS não lutou contra esta imposição, o Banco de Portugal também não e o terceiro maior banco do sistema, na altura já liderado por uma pessoa escolhida e convidada pelo próprio governador, Vítor Bento, foi mesmo riscado do mapa, com prejuízos enormes para milhares de depositantes e acionistas e para a economia nacional.

Não contente com isto o Banco de Portugal voltou a ter uma atuação perfeitamente opaca no caso do Banif, cuja resolução impôs em Dezembro de 2015, depois de ter assistido de forma passiva à aparente degradação da situação, tanto mais que tinha um homem nomeado por si na administração do banco, que depois passou a ser o responsável pela supervisão do banco central. Para além do custo para acionistas e clientes, desta vez os contribuintes também receberam uma fatura de três mil milhões para pagar. E o governador atirou responsabilidades para cima de todos (o presidente do Banif, o anterior e o atual Governo, a Comissão e o BCE), menos para si próprio.

Não contente com isso, o Banco de Portugal decidiu de repente passar cinco emissões obrigacionistas que estavam no Novo Banco para o banco mau, o que atraiu as atenções dos investidores internacionais para a situação do país e pressionou as taxas de juro da dívida pública para a alta, além de criar uma desconfiança acrescida na atração de investimento estrangeiro e novas pressões das agências de rating.

Agora, pelos vistos, o Banco de Portugal quebrou uma regra que se repetia anualmente: entregar os seus dividendos ao Estado em Abril, já que fecha as suas contas em Março. Pois bem, este ano passou essa entrega para Maio, o que está a ser um motivo adicional para em Bruxelas se pedir que o país seja alvo de sanções (pelos resultados de 2015) e que ponha em prática novas medidas (porque a evolução orçamental não está em linha com o previsto).

Disse o primeiro-ministro que, se o Banco de Portugal tivesse entregue as verbas em causa em Abril, a evolução orçamental estaria em linha com o previsto e seria mesmo mais favorável. Mais: explicou que bastaria isso para que o défice estivesse com uma evolução melhor, mesmo que o Banco de Portugal, justificando-se com uma alteração de regras, vá entregar este ano ao Estado apenas um terço do que entregou em anos anteriores.

Ora mesmo sem uma pessoa ser adepto das teorias da conspiração, começam a ser casos demais contra os interesses do país. Ou se levarmos a teoria ainda um pouco mais longe, começam a ser casos demais contra o atual Governo, com que obviamente o governador não compartilha as mesmas opções económicas e ideológicas.

Convenhamos, por isso, que Carlos Costa começa a estar a mais na liderança do Banco de Portugal. Mas como manifestamente não se vai demitir, então talvez seja boa ideia começar a chamar-lhe funcionário superior do BCE e não governador do Banco de Portugal – que, como digo, já não existe. O que há é uma casta de funcionários, que não estão sujeitos às leis do país, liderados por um senhor que está sempre do lado de Bruxelas e Frankfurt – e não de Portugal.

Entrevista com Cristina Casalinho

Segunda-feira, Maio 23rd, 2016

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RTP com som

Rating
Este ano o nível de rating de Portugal deverá manter-se no “lixo” para a Fitch, a Moody’s e a Standard & Poors. A convicção é da presidente do IGCP – Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública. Cristina Casalinho não acredita que este ano as agências de rating alterem para investimento o nível de rating português. Refere: “É pouco provável” porque o outlook não se alterou e mantem-se estável. Para a responsável pela gestão da dívida pública, as agências de rating acham que o historial de trajectória descendente da dívida pública portuguesa, ainda não é suficiente para permitir ter decisões sólidas.

Dívida
É também por essa razão que Cristina Casalinho considera que para já não é possível emitir dívida a 50 anos como fez a Espanha. No entanto, não coloca totalmente de parte essa possibilidade no futuro e adianta mesmo que se trata de uma expectativa a “acalentar”.

BANIF
A presidente do IGCP considera que uma boa venda do Novo Banco seria conseguir que a venda fosse executada com o máximo de reembolso possível do empréstimo efectuado pelo Estado ao Fundo de Resolução, para permitir que a execução dos pagamentos antecipados ao FMI se concretize. Se assim não for, a meta prevista de 3,3 mil milhões pode ficar comprometida.

Banco mau
Sobre a constituição de um “banco mau” Cristina Casalinho refere não ter conhecimento suficiente para se pronunciar. Lembra apenas que os investidores não gostam de surpresas e por isso se houver “alterações de rota” sugere que sejam comunicadas com antecedência para permitir um ajustamento.

Investimento
É preciso poupar mais mas continua a ser fundamental atrair os investidores estrangeiros para que haja mais pessoas a transaccionar a dívida publica e a diversificar os investimentos.

BCE
Cristina Casalinho admite que o pós programa BCE vai ter impactos. Considera que “é complicado acreditar que não vai haver qualquer tipo de efeito” mas adianta que “não há a noção do impacto. Sabe-se apenas que será significativo”. No entanto Portugal, segundo a presidente do IGCP, já se está a preparar para essa mudança, diversificando os produtos disponíveis porque “não se pode por os ovos todos num cesto” e criando uma almofada financeira.

 

Santander volta a contradizer o que Centeno disse no inquérito ao Banif

Segunda-feira, Maio 2nd, 2016

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Negócios

António Vieira Monteiro diz que a colocação de dívida pública de 1,8 mil milhões de euros no Santander Totta era hipótese desde a resolução. O ministro já disse que a negociação foi apenas posterior.  

O Santander e o ministro das Finanças continuam a dar respostas distintas sobre o financiamento de 1,8 mil milhões de euros que o Santander concedeu ao Estado após a resolução do Banif. Tudo por conta da origem desse financiamento.

António Vieira Monteiro, o presidente executivo do banco de capitais espanhóis, deixou claro esta segunda-feira, 2 de Maio, que esta colocação de dívida pública directamente no Santander Totta era “uma opção que estava na proposta inicial, que podia [ou não] ser concretizada”.

A proposta de financiamento estava incluída no concurso (a que o Santander concorreu mas que acabou sem sucesso) e também na resolução (onde o Santander foi o comprador), deixou claro Vieira Monteiro quando questionado pelos jornalistas.

Ora, Mário Centeno, ministro das Finanças, já disse no Parlamento, mais precisamente na comissão parlamentar de inquérito, que a colocação de dívida foi “negociada posteriormente à resolução”.

Este financiamento foi concedido porque o Estado teve de gastar 1.766 milhões de euros da sua almofada de capital para limpeza do Banif no âmbito da resolução. Havia, então, de repor esta almofada e foi aí que o Santander fez um empréstimo, exactamente no mesmo montante, ao Estado.

Assim, neste momento, mantém-se uma ideia contrária às duas partes nesta colocação privada de dívida pública: o banco diz que a compra era uma hipótese desde Dezembro, tendo sido concretizada posteriormente; o ministro defende que a negociação não era uma contrapartida inserida na resolução e que foi negociada meses depois, quando foi necessário repor o dinheiro perdido.

Eurostat: sem ajudas ao sector financeiro défice de 2015 ficava em 2,8%

Quinta-feira, Abril 21st, 2016

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Expresso

Gabinete de estatísticas da União Europeia confirmou esta quinta-feira que Portugal terminou 2015 com um défice de 4,4% do PIB. Mas sem os apoios a instituições financeiras, a maior parte relacionada com o Banif, ficava em 2,8%

O Eurostat, gabinete de estatísticas da União Europeia, confirmou esta quinta-feira que Portugal terminou 2015 com um défice de 4,4% do Produto Interno Bruto (PIB).

Porém, como avançou ao Expresso fonte do Eurostat, sem ajudas a instituições financeiras – onde podem entrar outras entidades além de bancos – contabilizadas em 1,6% do PIB, o défice de 2015 ficava em 2,8%, abaixo do limite de 3% definido nas regras de Maastricht.

O Eurostat não revelou o detalhe destas operações mas, de acordo com o reporte enviado pelo Instituto Nacional de Estatística, o grosso está associado à resolução do Banif. A intervenção no banco teve um impacto de 1,4 pontos percentuais no défice, qualquer coisa como 2463 milhões de euros.

DÉFICE EXCESSIVO

A dívida pública, segundo Eurostat, situou-se em 129% do PIB no ano passado. Um valor que representa uma descida face ao ano anterior – 130,2% – mas que é duas décimas superior ao número avançado pelo INE no final de março. Nessa altura, o INE alertou que o nível reportado de 128,8% era da responsabilidade do Banco de Portugal e que não incluia cerca de 300 milhões de dívidas associadas ao Banif ‘mau’, o banco que sobrou da operação no Banif.

O INE insistia que deveria ser incluído na dívida, o banco central não o fez e, agora, o Eurostat vem corrigir o valor em alta para incluir precisamente as duas decimas referentes a esse endividamento.

Estes dados do Eurostat sobre o défice e a dívida pública serão apreciados em maio pela Comissão Europeia, no âmbito do Procedimento por Défices Excessivos (PDE) a que Portugal está sujeito desde 2009. Serão avaliados também em paralelo com o Programa de Estabilidade e o Programa de Reformas que esta semana serão divulgados.

Embora o défice tenha ultrapassado o limiar dos 3% do PIB, o Governo tem reiterado junto da Comissão Europeia que, para efeitos da apreciação do esforço de consolidação orçamental, a operação do Banif não deve ser considerada. O que colocaria o défice precisamente no limite máximo.

Lista “não exaustiva” das 21 falhas que Bruxelas apontou no plano para o Banif

Sábado, Abril 9th, 2016

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Observador

O comissário da Concorrência escreveu em julho de 2013 à ministra das Finanças a mostrar preocupação e enviou uma lista “não exaustiva” das 21 falhas no plano para o Banif proposto por Lisboa.

O plano de reestruturação do Banif começou a ser negociado em Bruxelas no início de 2013 depois da DG Comp (direção-geral da Concorrência) ter aprovado, de forma preliminar, a recapitalização pública do banco.

Mais de dois anos e meio depois e oito planos, ou versões de planos na versão da gestão do Banif , ainda não havia acordo sobre as medida de reestruturação a aplicar e em agosto do ano passado, a DG Com anuncia a abertura de uma investigação aprofundada às ajudas de 1.100 milhões de euros, concedidas pelo Estado português.

Maria Luís Albuquerque sublinhou esta quarta-feira que se é verdade que o plano nunca foi aprovado, também nunca foi recusado. E realçou que a DG Comp poderia ter inviabilizado a ajuda pública logo em 2013. Mas não o fez. A ex-ministra das Finanças reconheceu contudo, na audição na comissão parlamentar de inquérito ao Banif, que a negociação da reestruturação foi sempre mais difícil que a dos outros bancos e que ceticismo do outro lado era muito maior.

Ao longo deste período, realizaram-se cerca de 200 reuniões. Houve avanços e recuos na negociação do famoso commitment catalogue (várias vezes referido pelos antigos gestores do Banif), um catálogo que procurava estabelecer as condições que devia seguir o plano de reestruturação do banco. E mesmo quando a parte portuguesa, Ministério das Finanças, banco e Banco de Portugal, confiavam que tinham ultrapassado um obstáculo, como a famosa tese de reduzir o Banif a banco das ilhas, a imposição voltava como aconteceu em 2014.

Maria Luís atribuiu esta viragem ao comportamento típico de uma administração pública, em Lisboa ou em Bruxelas, perante a chegada de um novo chefe, neste caso a comissária europeia Margrethe Vestager. Assuntos que já estavam arrumados voltam a ser colocados em cima da mesa pelos serviços técnicos.

Mas afinal quais eram os problemas para a direção geral da concorrência? Em julho de 2013, em anexo a uma carta enviada pelo comissário da Concorrência, Joaquín Almunia, segue uma lista descrita como “não exaustiva” das principais falhas detetadas no plano que tinha sido recebido no dia 29 de junho, quase seis meses depois do arranque das negociações.

  1. A futura rentabilidade do banco não estava sustentada, não havia uma clara separação dos números fundamentais. Os serviços queixavam-se da ausência de uma distinção entre os volumes de crédito existentes e as suas margens e os novos volumes de crédito e respetivas margens. Notavam ainda que uma parte substancial dos lucros previstos resultava de mais-valias com a dívida pública portuguesa.
  2. Quais as razões por trás das dificuldades do Banif. Bruxelas destacava que a performance do banco era pior do que a dos concorrentes, em particular ao nível das imparidades de crédito. Considerava por isso que a crise económica, invocada pela gestão do Banif, não era argumento suficiente, leitura que foi aliás confirmada pelo administrador do Estado no banco entre 20123 e 2014. António Varela descreveu um banco mau, muito mau a nível da gestão, com descontrolo no crédito concedido, exposição concentrada no imobiliário e em poucos clientes. Sublinhou contudo a excelente equipa comercial e fidelidade dos clientes. Para os técnicos europeus, o plano de reestruturação deveria focar mais nos problemas internos, nomeadamente de gestão de risco e critérios de concessão de crédito.
  3. A estratégia comercial para o futuro ainda ainda estava em elaboração. A falta de finalização e sustentação desta estratégia colocava em sérias dúvidas a credibilidade e a solidez de todo o plano de reestruturação, bem como as condições da sua implementação com sucesso.
  4. Implementação e consistência da nova estratégia. O plano proposto tinha pouco detalhe sobre como seria implementada a nova estratégia. Faltavam números fundamentais sobre os ativos imobiliários que seriam objeto de desinvestimento.
    1. Cobertura geográfica em Portugal. Foi desde o início um dos principais braços-de-ferro entre o Banif e a DG Comp cujo ponto de partida era claro: o Banif deve estar focado nas ilhas e na comunidade emigrante, mantendo apenas uma presença muito seletiva em Portugal continental. Estas operações representavam 40% da atividade do grupo e seriam autosustentáveis. Mas o banco concluiu entretanto que precisava da atividade no mercado continental para manter uma dimensão que lhe permitisse reembolsar a ajuda pública e propôs apenas abandonar quatro regiões. Bruxelas insiste que é preciso mais.
    2. Separação das atividades core (estratégicas) e não core. Os serviços queixavam-se de que os critérios dessa separação não eram claros, o que dificultava a sua monitorização. Bruxelas já insistia na divisão do banco em dois, a operação comercial saudável, e uma espécie de banco mau, batizado de Legacy Bank (herança), que receberia os ativos de maior risco e com mais imparidades (imobiliário, crédito e operações a desinvestir).
    3. Desinvestimento nas operações não estratégicas através de venda ou descontinuação. O plano previa a alienação das operações em Malta, Brasil e Cabo Verde, mas não referia o impacto desses negócios na atividade (sabemos que o Banif teve de reconhecer perdas elevadas no banco do Brasil), nem o que aconteceria se não fosse possível concretizar a venda.
    4. Um vínculo claro entre os compromissos e o plano de reestruturação para permitir a sua monitorização. Os serviços insistiam que os compromissos assumidos deveriam ser passíveis de serem vigiados e que deveriam estar refletidos no plano de reestruturação.
    5. Sistemas de informação e apoio à gestão precários. Dos contactos desenvolvidos, a DG Comp concluiu que o Banif não tinha os necessários sistemas de informação e instrumentos de apoio à administração. Uma das fragilidades identificadas prendia-se com a gestão do risco dos clientes. A constatação destas falhas técnicas irritou mesmo os serviços europeus quando numa das oito versões do plano entregues foram detetados vários erros. Este problema só terá sido ultrapassado já em 2015.
    6. O nível de resistência dos depósitos. Os serviços de Bruxelas tinham dúvidas sobre a capacidade de resistência dos depósitos do banco ao corte na remuneração (juros) oferecida aos clientes, por imposição regulatória, mas também por restrições do plano de reestruturação. E pediam mais informação sobre o impacto das medidas na evolução dos depósitos. O Banif teve problemas de liquidez em 2012 antes da recapitalização pública.
    7. Metas chave (rácios de transformação entre crédito e depósitos e rácio de custos sobre receitas). A DG Comp alertava que a meta de 120% do rácio de depósitos sobre crédito, imposta à banca portuguesa, até 2017 não seria alcançada ao nível de todo o grupo, mas apenas na área do retalho.
    8. Ausência dos resultado dos testes de stress e as respostas para eventuais necessidades de capital. Os serviços da concorrência reconheciam que estes testes à resistência do balanço dos bancos ainda estavam a decorrer, mas defendiam que o plano de reestruturação deviam incorporar estes impactos.
    9. O impacto da descida do rating da Moody’s. A DG Comp exigia que o plano de reestruturação incorporasse os efeitos desta revisão da nota da dívida e as implicações nas condições do financiamento ao Banif.
    10. A dívida pública (obrigações do tesouro) que estava no balanço do banco e o cumprimento dos limites de exposição, no quadro da gestão de risco. Os técnicos pediam mais informação sobre a exposição do grupo à dívida do Estado, na altura estimava em 2.900 milhões de euros.
    11. Teto à nova produção bancária. O plano apresentado não refletia as implicações dos limites à expansão da atividade definidos no commitment catalogue (catálogo de compromissos).
    12. Crescimento da quota de mercado. A proposta entregue sugeria que o Banif ia conseguir aumentar a sua quota de mercado (até 50% em segmentos chave), mas não explica como pretende alcançar esse crescimento e que oferta diferenciada irá apresentar para obter. Os técnicos pediam um plano mais específico e credível nesse aspeto.
    13. Definição de quotas de mercado. O plano não era claro quanto aos critérios usados para definir as quotas de mercado, em particular nas comunidades portuguesas da Venezuela, Estados Unidos, África do Sul.
    14. Subsidiárias em zonas offshore. A proposta referia a existência de operações nas ilhas Cayman e nas Bahamas, mas não especificava o que irá acontecer a essas entidades e se deviam permanecer operacionais. Bruxelas alertava para o risco reputacional da presença em tal geografias.

              15 Aumento recente de capital. Bruxelas queria saber mais sobre a tranche de                       100 milhões de euros subscrita pelos maiores acionistas privados, a Rentipar e a                    Autoindustrial, no verão de 2013. Este reforço fazia parte da tranche de                                      investimento privado do plano de recapitalização aprovado que só parcialmente                      concretizada.

              16 Remuneração da ajuda do Estado. Este tem sido um dos focos da                                   comissão de inquérito. O plano previa apenas o reembolso dos instrumentos de                      dívida subscritos pelo Estado (os Cocos), mas segundo Bruxelas não abordava a                      questão de como e quando os juros seriam liquidados. Estas obrigações davam um                juro de 10% ao ano. Foi também exigida uma avaliação da possibilidade do Estado                 converter estas obrigações em capital com direitos de voto e como seria toda a                         ajuda pública reembolsada e remunerada.

 

             17.Posição de capital em 2017. O plano previa uma melhoria do capital próprio                   de 137 milhões de euros em 2017, face a 2016, graças a resultados positivos e à                         inclusão do Banif Mais (unidade de crédito ao consumo), mas esses efeitos não                       estavam suficientemente explicados, segundo os serviços de Bruxelas.

Para além destas falhas, os serviços da DG Comp identificam ainda, em anexo, seis temas que faltavam na documentação enviada:

  • Reajustamento do plano de negócios na ausência de medidas.
  • Adoção de mudanças impostas pelo ambiente regulatório.
  • Impacto de cada medida (planeada para restaurar a viabilidade e limitar distorções na concorrência) no balanço e resultados do Banif.
  • Discrição dos incentivos à saída do Estado.
  • Os pressupostos assumidos nos testes de stress em curso para o pior cenário possível.

A surpresa de Maria Luís perante tantas falhas

Em resposta, Maria Luís Albuquerque, acabada de chegar ao lugar de ministra, sublinha que os comentários à credibilidade, coerência e substância do plano nesta fase, constituem uma “surpresa”, dado o diálogo “intenso, aberto e construtivo” entre o Banif e as equipas europeias nos últimos meses. Acrescenta ainda que algum progresso tinha sido feito entretanto e responde com clarificação para cinco dos pontos levantados.

Um dos temas diz respeito à dimensão do futuro Banif em que é sublinhada existência de um “acordo verbal” com data de abril que previa o abandono das operações em sete distritos do continente (em vez dos quatro referidos na lista).

Algumas destas divergências e faltas foram sendo ultrapassadas, mas no essencial o impasse negocial manteve-se até à abertura da investigação aprofundada à ajuda de Estado em agosto de 2015, que foi o prelúdio para o fim do Banif.

Impacto do Banif na dívida pública divide Banco de Portugal e Bruxelas

Quinta-feira, Março 31st, 2016

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Observador

Organismo de estatística da União Europeia, Eurostat, defende que o passivo do Banif em liquidação deve entrar na dívida pública, ao contrário de posição do Banco de Portugal.

A intervenção pública no Banif e o seu impacto nas contas de Portugal foram alvo de divergências entre as autoridades portuguesas e o Eurostat, organismo de estatística da União Europeia, que estiveram na origem do adiamento por uma semana do reporte sobre o défice e a dívida do Estado de 2015.

Segundo, a comunicação divulgada pelo Instituto Nacional de Estatísticas (INE), o Eurostat defende que o passivo da sociedade que fica responsável pela liquidação do Banif deverá ser incluído na dívida das administrações públicas. Ora, esse não é o entendimento dado pelo Banco de Portugal ao INE e que é apresentado no destaque desta quinta-feira. A interpretação do Eurostat elevará a dívida pública do ano passado para 129% do Produto Interno Bruto, mais 0,2 pontos percentuais do que o rácio apurado pelo BdP e que é de 128,8%.

A diferença resulta da inclusão do passivo do Banif SA, entidade descrita como o “Banif residual” e que é da ordem dos 295 milhões de euros.

As autoridades nacionais avaliam como sendo baixa ou mesmo nula a probabilidade do Estado vir a assumir a responsabilidade por este passivo com a conclusão do processo de liquidação. No entanto, no entendimento do Eurostat, o passivo da entidade residual Banif SA deverá se incluído na dívida das AP (administrações públicas), o que não está refletido nos dados remetidos pelo Banco de Portugal e apresentados neste destaque”.

A comunicação do INE feita ao abrigo do procedimento dos défices excessivos considera que a operação de resolução do Banif teve um impacto de 746 milhões de euros no valor da dívida de 2015, através da inclusão das obrigações emitidas pela Oitante, sociedade veículo que ficou com os ativos que foram destacados da operação vendida ao Santander.

O INE confirma que o impacto do Banif no défice do ano passado ascendeu a 2.463 milhões de euros, o que equivale a 1,4%, elevando o valor final a 4,4% do Produto Interno Bruto. Os dados relativos à dívida pública, e que foram hoje conhecidos, são da responsabilidade do Banco de Portugal.

Esclarecimento sobre o tratamento metodológico da resolução do BANIF e o respetivo impacto nas estatísticas compiladas pelo Banco de Portugal

Quinta-feira, Março 31st, 2016

Citamos

Banco de Portugal

O valor da dívida pública relativa a 2015 apurado pelo Banco de Portugal incluído na notificação do procedimento dos défices excessivos situou-se em 231 mil milhões de euros (128,8 por cento do PIB). Este valor corresponde à informação publicada pelo Banco de Portugal no dia 1 de fevereiro de 2016 e objeto de divulgação na Nota de Informação Estatística então publicada. Como então foi mencionado, a operação de resolução do BANIF teve impacto naquele valor, através da inclusão dos títulos de dívida emitidos pela Oitante (746 milhões de euros), entidade criada neste contexto.

Tendo por base o enquadramento metodológico relevante para a compilação das estatísticas da sua responsabilidade, o Banco de Portugal considera que a Oitante deve ser classificada no setor institucional das administrações públicas, enquanto o BANIF S.A. (entidade residual resultante da resolução do BANIF) deve ser classificado no setor financeiro, pelas razões que se sintetizam a seguir:

      a. O BANIF está incluído na lista de instituições financeiras monetárias do Banco Central Europeu. De acordo com Sistema Europeu de Contas Nacionais e Regionais, no qual se baseia a compilação da dívida pública, «As “instituições financeiras monetárias” (IFM), definidas pelo BCE, abrangem todas as unidades institucionais incluídas nos subsetores “banco central” (S.121), “entidades depositárias, exceto o banco central” (S.122) e “FMM” (S.123).»
        b. Esta classificação está de acordo com a Opinião

    [1]

        , publicada em setembro de 2015 pelo CMFB – Comité de Estatísticas Monetárias, Financeiras e da Balança de Pagamentos

    [2]

        , sobre a classificação de entidades sujeitas a processos de resolução. De acordo com as regras de classificação constantes dessa Opinião, o BANIF S.A., por ser uma instituição de crédito autorizada e por não ser controlada pelas administrações públicas, deve ser classificado no setor financeiro. Aquela Opinião foi emitida tendo em vista garantir um tratamento consistente da classificação deste tipo de entidades entre os vários domínios estatísticos e pelos vários países, bem como para garantir que as estatísticas refletem a substância económica das transações.
      c. O setor institucional das administrações públicas inclui apenas entidades controladas por instituições governamentais, o que não é o caso do BANIF S.A..

    Adicionalmente, independentemente da classificação do BANIF S.A. no setor financeiro ou no setor das administrações públicas, o Banco de Portugal considera que os seus passivos (no valor de 295 milhões de euros ou seja 0,16% do PIB) não devem ser refletidos na dívida pública pois a amortização dessa dívida será decidida no contexto da liquidação desta entidade, não constituindo uma responsabilidade do Estado.

    Em conclusão o Banco de Portugal entende que o BANIF S.A. é ainda uma entidade que continua a integrar o setor financeiro e que os seus passivos, por não serem uma responsabilidade do Estado Português, não devem ser incluídos na dívida pública. Continua, igualmente, empenhado em prosseguir o aprofundamento metodológico desta matéria envolvendo as Autoridades Estatísticas Nacionais e Europeias, com o objetivo suprarreferido de garantir um tratamento consistente entre os vários domínios estatísticos e os vários países.

    Lisboa, 31 de março de 2016

    [1] Ver CMFB opinion of the statistical classification of entities under resolution.
    [2] De acordo com a Decisão do Conselho que cria o CMFB – Comité de Estatísticas Monetárias, Financeiras e de Balanças de Pagamentos (2006/8568EC), este Comité pode, por sua própria iniciativa, emitir pareceres sobre qualquer questão estatística de interesse mútuo para a Comissão e os institutos nacionais de estatística, por um lado, e o Banco Central Europeu (BCE) e os Bancos Centrais Nacionais, por outro.

    Banco de Portugal diz que está a receber queixas de clientes do Banif

    Sexta-feira, Março 25th, 2016

    Citamos

    Observador

    O Banco de Portugal diz que não conhece acordo entre o Governo e o Santander para comprar de dívida pública. Regulador conta que tem recebido muitas queixas de clientes sobre produtos de investimento.

    O Banco de Portugal está a receber queixas de clientes do Banif que contratualizaram com o banco produtos de investimento. O regulador assume que está a receber reclamações e a direcioná-las para a Comissão de Mercado de Valores Mobiliários. Contudo, não especifica se essas reclamações se prendem com o facto de os clientes pensarem que o que se tratava de um depósito e afinal era um produto financeiro.

    Esta é uma das queixas mais frequente de alguns clientes que alegam desconhecimento sobre o tipo de aplicação que tinham com os bancos e que aconteceu em larga escala, por exemplo, no Banco Espírito Santo. No caso do Banif, a resolução afetou detentores de algumas obrigações do banco, mas o governo tem sublinhado que a decisão de excluir a dívida sénior do Banif procurou proteger depósitos, sobretudo de clientes emigrantes.

    O Banco de Portugal não aprofunda a questão, numa resposta que deu aos deputados do CDS, mas admite que “têm sido dirigidas ao Banco de Portugal algumas reclamações de clientes ou antigos clientes do BANIF – Banco Internacional do Funchal, S.A. (“BANIF”) relativamente à contratação, com essa instituição, de instrumentos ou produtos financeiros”.

    Na mesma resposta, o Banco de Portugal adianta que essas “descrições de situações nas quais as pessoas contrataram com o BANIF produtos de investimento” estão a ser reencaminhadas para a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e que além de queixas, tem recebido vários pedidos de esclarecimento relativos “aos efeitos da medida de resolução aplicada ao BANIF”.

    Apesar da intervenção no banco, o Banco de Portugal garante que “não tem conhecimento, quer através de
    reclamações de clientes, quer no âmbito dos contactos frequentes mantidos com o BANIF, com o
    Banco Santander Totta, S.A. e com a Oitante, S.A.” de “perturbações na realização das operações bancárias
    habituais, como o levantamento de quantias e o pagamento de juros, relativas aos direitos e às
    obrigações do BANIF transferidos com a medida de resolução”, escreve na resposta.

    Banco de Portugal não sabe de acordo entre Governo e Santander

    O banco Santander já assumiu que comprou dívida pública no valor de 1.766 milhões de euros para ajudar o Estado a financiar a intervenção no Banif. E justificou a operação com a vontade de “contribuir para diminuir o esforço de financiamento do Estado português”. Mas o Banco de Portugal diz que não sabe de nenhum acordo entre o Governo e o Santander para a compra de dívida pública em troca da venda do Banif.

    Numa outra resposta a perguntas de deputados do CDS, o Banco de Portugal escreve preto no branco: “O Banco de Portugal não tem conhecimento da existência de qualquer acordo entre o Estado Português e o Banco Santander Totta, S.A. com vista à aquisição de dívida pública portuguesa”.

    Contudo, o Santander ficou comprometido a adquirir 1.766 milhões de euros em Medium Turn Notes (MTN). E revelou em fevereiro que este financiamento ao Estado português foi acordado no quadro das medidas de capitalização para a correção do balanço do Banif, ainda anteriores à resolução e à venda de ativos e passivos. O banco liderado por Vieira Monteiro justificou a sua participação neste financiamento com a vontade de “responder positivamente ao desafio que lhe foi feito de contribuir para diminuir o esforço de financiamento do Estado, já que o simples facto de passar a deter estes títulos implica que o banco consuma capital em suporte dessa mesma detenção”.

    Comunicado do Santander Totta sobre financiamento ao Estado

    Quinta-feira, Fevereiro 25th, 2016

    Citamos Santader Tottta

    Nota sobre a aquisição de títulos de dívida pública

     

    1.No âmbito das medidas de capitalização para correcção do balanço do Banif imediatamente anteriores à medida de resolução e à venda de activos e passivos, foi acordado com o Santander Totta a aquisição por este banco, em data posterior, de títulos de dívida pública sob a forma de MTN (“medium term notes”) no montante de 1766 milhões de euros então emitidos pelo IGCP.
    2. O Banco Santander Totta preparou-se para fazer essa operação desde os primeiros dias de Janeiro, tendo o montante em causa sido depositado no BCE. A data escolhida (22 de Fevereiro e não 9 ou 10 como é dito em notícia hoje publicada pelo Jornal de Negócios) foi indicada ao Banco pelo IGCP no dia 19 de Fevereiro.
    3. Como se comprova pelo gráfico que se envia, a data não coincidiu com o auge dos juros, ao contrário do também afirmado na notícia. O pricing foi fechado às 10h de dia 22/02, ao yield de mercado interpolado das duas OTs que constam do gráfico, como é prática habitual no mercado.
    4. Ao aceitar fazer isto, o Santander Totta pretendeu apenas responder positivamente ao desafio que lhe foi feito de contribuir para diminuir o esforço de financiamento do Estado, já que o simples facto de passar a deter estes títulos implica que Banco consuma capital em suporte dessa mesma detenção.Chart_ PTOTETOE012=