Archive for Dezembro, 2016

Estado ainda deve 250 milhões ao Santander por causa do Banif

Terça-feira, Dezembro 20th, 2016

Citamos

Público

Foi na noite de domingo, dia 20 de Dezembro de 2015 que o primeiro-ministro António Costa anunciou a resolução do Banif e a sua venda ao Santander Totta.

Faz esta terça-feira um ano. A 20 de Dezembro de 2015 o primeiro-ministro anunciou a resolução do Banif e a respectiva venda ao Santander Totta. António Costa não escondeu que a operação teria “um custo muito elevado para os contribuintes”, mas há contas que ainda estão por fazer. O Estado ainda deve 250 milhões de euros ao Santander, por via de deduções fiscais que o banco de capitais espanhóis garantiu ao comprar o Banif por 150 milhões de euros.

Nas contas de 2015, o Santander Totta já inscreveu, aliás, um resultado positivo de 327,2 milhões de euros com a compra dos principais activos do Banif. Mas, além disso, ficou também estipulado que podia usar em seu benefício os prejuízos fiscais gerados pelo banco intervencionado. Ao todo, são 250 milhões de euros, mas que o Santander Totta ainda não pode usar para compensar lucros tributáveis futuros por ausência de luz verde das Finanças. Neste caso, os 250 milhões serão despesa fiscal a contabilizar no futuro pelo Estado. O Ministério das Finanças não respondeu às questões colocadas pelo PÚBLICO, mas o Santander afirmou que continua a aguardar pela respectiva autorização.

Não parece, no entanto, haver muitas alternativas. De acordo com o Santander, “caso não seja obtido o despacho favorável do ministro das Finanças ao requerimento” apresentado, o banco “tem direito a receber um montante equivalente em obrigações do tesouro ou numerário”.

Mas não foram apenas estes os ganhos do Santander ao comprar o Banif. Ganhou maior expressão no mercado português e ficou com uma carteira de activos da ordem dos 10 mil milhões de euros, e com cerca de 350 mil clientes.

O rombo para os contribuintes, segundo os números da Comissão Europeia, apontam para um limite de 3000 milhões de euros. Tudo devido a problemas num pequeno banco, com 3,7% de quota de mercado, e cujo capital era então dominado pelo Estado em mais de 60%.

A operação de resgate ao Banif surpreendeu pela dimensão do prejuízo a imputar aos contribuintes e que agitou o país nos últimos dias de 2015. Seguiu-se uma Comissão Parlamentar de Inquérito por onde desfilaram todos os protagonistas. Um deles foi o Santander Totta, o adquirente da instituição portuguesa, e que foi o grande vencedor da operação.

É que é expectável que a instituição liderada por António Vieira Monteiro registe futuramente um ganho que pode chegar ao intervalo entre 800 milhões e mil milhões de euros.

Já assumidos nas contas de 2015 estão os já referidos 327,2 milhões de euros. Ou seja, o banco espanhol considera que o valor de 150 milhões de euros que pagou ao Estado para ficar com o Banif é mais baixo do que o justo valor do banco [477,2 milhões de euros].

Mas a este montante, há ainda a somar os também já referidos 250 milhões de euros de resultados por impostos diferidos, dado que o Banif acumulava prejuízos. Por esse facto, o Santander tem agora a possibilidade de abater as perdas ao lucro tributado e transformar os 250 milhões num activo.

Mas ainda há mais ganhos que poderão ser registados. Do balanço do Banif à data do colapso (cerca de 12.000 milhões) transitaram para o Santander cerca de 10.500 milhões de euros. E deste valor, segundo fontes das entidades de supervisão, admite-se que aproximadamente 3.500 milhões dizem respeito a activos que passaram a preço zero: cerca de 1.500 milhões de obrigações; cerca de um milhão de créditos de cobrança duvidosa; cerca de um milhão de imóveis. Ora, se o Santander conseguir nos próximos anos recuperar, por exemplo, 15% dos 3.500 milhões, encaixa mais cerca de 500 milhões de euros.

Isto, sem contar com os ganhos para o banco de Vieira Monteiro da junção da operação bancária do Banif, que a 20 de Dezembro de 2015 possuía uma quota de mercado de 3,7%. O que coloca o Santander à frente do BPI, com uma fatia de 14,5%. E a controlar o mercado açoriano e madeirense, onde o Banif possuía, respectivamente, 35% e 25% do negócio.

Nos moldes em que a resolução do Banif foi desenhada, o banco espanhol nunca corre o risco de perder. O veículo do fundo de resolução que herdou os activos do Banif que ficaram fora do acordo celebrado com a família Botín, designado a Oitante, foi financiado em 746 milhões de euros pelo Santander. E o empréstimo (entrega de obrigações representativas de divida emitidas pela Oitante) foi avalizado pelo Fundo de Garantia que, por seu turno, apresentou uma contragarantia do Estado. Ou seja: se o fundo for chamado a pagar parte ou a totalidade dos 746 milhões, mais juros, e não tiver disponibilidades, o Estado substitui-se.

O acordo luso-espanhol, enquadrado numa medida de resolução, teve impacto nas contas públicas e foi mesmo determinante para que Portugal não saísse este ano do Procedimento por Défice Excessivo, mas não pôs em causa a estabilidade do sistema financeiro.

E foi promovido activamente ao mais alto nível pelas instâncias europeias cuja competência é a defesa dos depositantes e contribuintes: o Banco Central Europeu (BCE) e a DGcomp, a direcção-geral de concorrência da Comissão Europeia.

A correspondência trocada na época com as autoridades portuguesas, e que revelada durante a comissão de inquérito, indica que o BCE e a DGcomp, revelavam um padrão de grande informalidade e ligeireza a tratar do tema.

Basta lembrar o que se passou na manhã de 19 de Dezembro, quando decorria o concurso público de venda de o Banif, e a ainda presidente do Conselho de Supervisão do BCE, Daniéle Nouy, se dirigiu ao ministro das Finanças português, não sem antes ter feito uma “chamada” para o Santander “que correu muito bem”: “A Comissão Europeia vai aprovar” e “vai começar a trabalhar directamente” com o Santander que se “está a comportar de maneira muito profissional e tem um departamento legal excelente”. E Nouy deixou um conselho: “A Comissão Europeia foi muito clara neste aspecto, por isso, recomendo que nem percam tempo a tentar fazer passar essas propostas” que o Governo tem em cima da mesa.

Num tom que surpreende, pois estavam em causa perdas volumosas para os contribuintes portugueses, Centeno foi informado que Vítor Constâncio, o vice-presidente do BCE (e ex-governador do Banco de Portugal), estava a par das movimentações.

Foi também revelado na comissão de inquérito que desde Junho de 2015 que no Banco de Portugal se trabalhava para fazer vingar esta solução. O ex-vice-governador António Varela relatou aos deputados que a primeira reunião com o banco espanhol ocorreu em Junho, quando foi concluído o relatório apontando para a possível resolução.

As principais datas do Banif

Terça-feira, Dezembro 20th, 2016

Citamos

Público

Criado em 1988, o Banif acabaria por morrer em 2016

1988
O Banif nasce em Janeiro, através da incorporação da Caixa Económica do Funchal. Em 1992, as acções do banco liderado pelo empresário Horácio Roque entram em bolsa.

2012
Fevereiro

Jorge Tomé sai da Caixa Geral de Depósitos (CGD) para presidir ao Banif, que inicia um processo de reestruturação, fechando agências e despedindo centenas de trabalhadores.

Março
O Banif chumba na avaliação do Banco de Portugal aos indicadores e metodologias usados nos testes de resistência a cenários macroeconómicos adversos.

Dezembro
O Estado injecta 1.100 milhões de euros no Banif, dos quais 700 milhões em capital e mais 400 milhões em obrigações subordinadas de conversão contingente (as CoCos). Passa a deter 99,2% do banco, que regista prejuízos históricos de 576,4 milhões de euros.

2013
Agosto

O Banif reembolsa o Estado (com um atraso de dois meses) em150 milhões de euros.

2014
Abril
O Banif devolve mais 125 milhões ao Estado, ficando a faltar outros 125 milhões para completar o reembolso das CoCos.

Dezembro
O banco falha o pagamento dos restantes 125 milhões do empréstimo público.

2015
Julho

A Comissão Europeia, que rejeitou sucessivos planos de reestruturação do Banif, abre uma investigação aprofundada ao auxílio de Estado atribuído ao banco.

Dezembro
Dia 11

O Banif confirma que há um processo para vender a posição do Estado a um investidor privado. Dois dias depois, a TVI 24 noticia que a intervenção pública no banco é iminente, o que o Banif desmente.

Dia 14
O Governo diz que está a acompanhar a situação do banco e quer garantir “a plena protecção dos depositantes”; Bruxelas frisa que qualquer solução tem de “assegurar a plena protecção dos depósitos”.

Dia 15
Em entrevista à SIC, Jorge Tomé, revela que tentou vender a posição do Estado no início do ano, mas que o executivo de Passos Coelho recusou a operação para não prejudicar a venda do Novo Banco. No mesmo dia, o primeiro-ministro reúne com os líderes dos vários partidos para discutir a situação do banco. Garante a protecção dos depósitos, mas admite que o processo pode ter custos para os contribuintes.

Dia 17
A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) suspende a negociação dos títulos do Banif em bolsa (as acções estavam a valer 0,2 cêntimos).

Dia 18
Surgem notícias de interessados na posição do Estado. Entre eles, os bancos espanhóis Santander e Popular e fundos de investimento, como o norte-americano Apollo, dono da Tranquilidade.

Dia 20
O Banco de Portugal anuncia a venda ao Santander por 150 milhões de euros.

Lesados do Banif entregam petição no Parlamento a pedir maior proteção aos investidores

Quinta-feira, Dezembro 8th, 2016

Citamos

Observador

A Associação de Lesados do Banif e do Santander Totta, entregou no Parlamento, uma petição assinada por mais de 4 mil pessoas que pede que sejam criados mais mecanismos de proteção aos investidores.

A Associação de Lesados do Banif e do Santander Totta, Alboa, entregou esta terça-feira, no Parlamento, uma petição assinada por mais de 4.000 pessoas que pede que sejam criados mais mecanismos de proteção aos investidores que fazem aplicações em instrumentos financeiros.

Após a entrega da petição na Assembleia da República, esta terça-feira à tarde, representantes da associação são recebidos pelos grupos parlamentares do Bloco de Esquerda (com a deputada Mariana Mortágua), do PSD (ainda não conhecendo o interlocutor) e do Partido Socialista (com o líder parlamentar Carlos César).

Segundo os signatários, quando foi feita a recapitalização pública do banco, em 2013 (no valor de 1.100 milhões de euros), tal foi aproveitado pelos “comerciais e estruturas [do Banif] para venda de produtos às pessoas, sobretudo na Madeira e nos Açores, regiões em que o Banif era muito forte, tendo sido “raros os madeirenses que não compraram um pequeno cabaz de ações”. Já “nos Açores os comerciais deslocavam-se aos campos para venderem obrigações (…) enquanto o agricultor arranjava o gado para os trabalhos do dia”.

Esta petição promovida pela Alboa considera, assim, que foram vendidos produtos a investidores não qualificados, que não tinham conhecimentos nem noção dos riscos envolvidos. Por isso, é pedido aos deputados que discutam a “criação de regras claras na delimitação dos perfis dos investidores não qualificados, junto das instituições financeiras” e que seja “expressa e inequívoca” a qualificação de um investidor como qualificado.

A associação que representa os clientes que se sentem lesados pela resolução do Banif define mesmo os critérios para um investidor ser classificado como qualificado: “ter efetuado operações com um volume significativo no mercado, com uma frequência média de dez operações por trimestre, durante os últimos quatro trimestres; dispor de uma carteira de instrumentos financeiros, incluindo também depósitos em numerário que exceda 500 mil euros; prestar ou ter prestado funções no setor financeiro, durante, pelo menos, um ano, em cargo que exija conhecimento dos serviços ou operações em causa”.

Além disso, defendem os signatários, deverá haver um documento onde “o cliente expressamente assume a vontade dessa caracterização ao nível de investidor”. Sobre os testes de adequação que já são obrigatórios para verificar se o instrumento financeiro é adequado ao perfil do investidor, o texto da petição refere que muitos bancos fazem disso apenas “uma mera formalidade, ou mais um impresso para ser assinado”.

Outra das propostas da petição promovida pela Alboa é que os bancos sejam proibidos de colocar junto de investidores não qualificados títulos emitidos por entidades com que esse banco tenha uma relação, nomeadamente emitidos por entidades que fazem parte do grupo desse banco.

A petição quer ainda que sejam criados organismos para defesa de investidores não qualificados, considerando que o serviço de mediação voluntária de conflitos da CMVM, apesar de ser um “avanço meritório”, não é suficiente.

Pedem, assim, que seja criada uma nova entidade que assuma o debate de litígios entre particulares, instituições financeiras e entidades emitentes de produtos financeiros e que, no caso dos bancos, estes sejam mesmo obrigados a participar em resolução de conflitos nesta entidade sempre que vendem produtos financeiros a um investidor não qualificado.