A ideia do Governo para a supervisão financeira

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Económico Francisco Ferreira da Silva Opinião

Carlos Tavares, presidente da CMVM, mantém-se à frente da instituição apesar de ter terminado o mandato em Setembro do ano passado. Esta poderá ser uma forma de o Governo, não podendo afastar Carlos Costa do BdP, retirar-lhe uma parte do poder.

Uma nova arrumação da supervisão do sistema financeiro pode ser a solução do Governo para retirar poderes a Carlos Costa e ao Banco de Portugal. Tudo indica que a Autoridade de Seguros será um dano colateral.

António Costa afirma que o Governo está empenhado em separar o sistema de supervisão do sistema de resolução do sector financeiro e sublinha que existe “um consenso alargado sobre a necessidade de se fazer a separação entre os dois sistemas”, diminuindo “potenciais conflitos de interesse” na condução das duas funções. O primeiro-ministro acrescenta que o Governo “está determinado em alterar o quadro existente para aumentar a eficácia dos sistemas, o que reforçará a independência da entidade de supervisão”.

Uma ideia que o ministro das Finanças também desenvolveu na conferência sobre ‘O Presente e o Futuro do Sector Bancário’. Mário Centeno defendeu que a “Autoridade de Resolução deverá ser independente das instituições de supervisão financeira” e “as funções transversais de supervisão deverão estar incluídas em organismos que possam ter uma capacidade de intervenção transversal”. Para o ministro, “a complexidade dos produtos financeiros não é compatível com a fragmentação das responsabilidades de regulação e requer mecanismos de controlo multilateral”.

Sem defender nenhum tipo de solução, Mário Centeno deixou a sensação de que defende o modelo ‘twin peaks’, de que falou quando disse que “procurando evitar uma multiplicação de entidades, alguns países têm procurado uma uniformização por áreas, os chamados Pilares Gémeos”. Sobretudo quando acrescentou: “A supervisão prudencial por um lado, a comportamental por outro. Abrangendo tanto bancos, como seguradoras ou fundos de pensões, bem como o mercado de capitais”.

É o recuperar de uma ideia em voga em 2008/2009, que só não foi posta em prática porque a União Europeia adoptou a divisão que já existia em Portugal e que, assim, se manteve. A ideia inicial era entregar a supervisão prudencial a uma entidade, com vista ao reconhecimento e ao controlo dos riscos e a assegurar a resiliência do sistema e das instituições financeiras por forma a garantir a estabilidade financeira. Já a supervisão comportamental também seria entregue a uma única entidade, incidindo sobre normas de conduta e direccionada para a regulação do direitos e interesses dos investidores e consumidores de produtos e serviços financeiros.

Se se confirmar a ideia do sistema ‘twin peaks’, a supervisão prudencial de todo o sistema financeiro – banca, seguros e mercado de capitais – ficará entregue ao Banco de Portugal e a comportamental a uma entidade que resultará da junção dos serviços do Banco de Portugal, CMVM e Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões. Tudo ligado pelo reforço de poderes do Conselho de Supervisores Financeiros, capaz de fazer uma “avaliação independente dos fenómenos transversais ao sistema financeiro”, como referiu o ministro. Centeno concluiu que esse órgão carece ainda de “um reforço de competências” e “deve constituir-se como um elemento importante de ligação entre as diferentes entidades de supervisão”.

A ideia esboçada pelo ministro das Finanças explica a razão pela qual Carlos Tavares, presidente da CMVM – entidade que tem por missão supervisionar e regular os mercados de instrumentos financeiros, assim como os agentes que neles actuam, promovendo a protecção dos investidores –, se mantém à frente da instituição, apesar de ter terminado o mandato a 15 de Setembro do ano passado. Esta poderá ser uma forma de o Governo, não podendo afastar Carlos Costa do Banco de Portugal, retirar-lhe uma parte do poder. Uma intenção que ficou patente numa frase de António Costa quando anunciou a intenção de reforçar a independência da entidade de supervisão, “designadamente na sua condução da política monetária”.