Bruxelas propôs a Maria Luís Albuquerque solução para vender Banif até 2017

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Económico

Um ano antes da resolução, a Comissão Europeia propôs a Maria Luís Albuquerque uma solução que, em seu entender, permitiria recuperar o capital injectado pelo Estado no Banif.

A Comissão Europeia propôs ao anterior Governo uma solução para o Banif, em Dezembro de 2014, que, em seu entender, permitiria resolver rapidamente o problema do banco, com os activos “tóxicos” a serem colocados num veículo especial e o negócio saudável a ser vendido de forma gradual, até ao final de 2017, revela uma carta a que o Económico teve acesso. A proposta de Bruxelas implicaria uma resolução, mas alegadamente poderia ter custos inferiores aos 2,2 mil milhões de euros registados um ano depois.

A missiva da comissária da Concorrência (disponível para consulta no site do Económico), foi enviada a Maria Luís Albuquerque a 12 de Dezembro de 2014, após o chumbo de seis planos de reestruturação apresentados pela gestão do Banif e pelo Governo português, seguindo-se a uma carta anterior, remetida em 31 de Março do mesmo ano, pelo comissário Almunia.

Já a perder a paciência, Bruxelas dizia a Lisboa o que teria de ser feito para desbloquear o impasse: o Banif teria de se focar nos Açores, na Madeira, em Lisboa e num reduzido número de distritos do continente. As operações internacionais teriam de ser vendidas ou encerradas. Deveria ainda ser criado um banco “mau” ou um veículo específico para ficar com os activos “tóxicos”, com uma separação efectiva entre ambos. E o banco “bom” seria vendido até ao final de 2017.

A comissária pedia ao Governo português que apresentasse um plano de reestruturação “credível”, o mais tardar até Março de 2015, nos termos deste esboço. Caso contrário, abriria uma investigação aprofundada ao Banif.

Mas o plano entregue não foi ao encontro destas linhas orientadoras definidas pela Comissão e esta abriu, de facto, uma investigação, em Julho de 2015, que só foi encerrada em Dezembro, com a resolução do Banif, que custou 2,2 mil milhões de euros aos contribuintes portugueses.

Esta elevada factura tem causado polémica e vai levar à abertura de uma comissão parlamentar de inquérito, servindo de arma de arremesso entre o Governo socialista e o PSD. Na sexta-feira, no Parlamento, o primeiro-ministro António Costa criticou a actuação do Executivo anterior e referiu a existência da carta enviada a Maria Luís Albuquerque, argumentando que a Comissão Europeia abria a porta a uma solução que tornaria desnecessária a recente resolução do Banif e o elevado custo que a mesma poderá ter para os contribuintes (no pior cenário, 3,6 mil milhões de euros).

Por sua vez, a ex-ministra das Finanças concedeu uma entrevista à TVI, a 21 de Dezembro, onde defendeu que haverá “claramente um problema de supervisão”. Disse ainda que o Banif nunca conseguiu convencer Bruxelas. “A situação do Banif era difícil porque a sua viabilidade era sempre questionada pela Comissão Europeia”, salientou a ex-ministra.

Resolução já era inevitável mas poderia ter um custo menor
Embora a carta enviada pela comissária da Concorrência não faça referência a uma medida de resolução, a mesma seria inevitável, dado que a criação de um banco “mau” implicaria, em qualquer caso, a prestação de garantias estatais e a aplicação de um ‘haircut’ nos activos “tóxicos”.

Os contribuintes teriam em qualquer caso de assumir custos com o processo de reestruturação do Banif, no que seria considerada uma nova ajuda de Estado. E as regras europeias são claras: salvo algumas excepções, se existir auxílio estatal, a resolução é obrigatória.

A diferença face à medida aplicada em Dezembro de 2015 poderia residir no valor das perdas que os contribuintes teriam de assumir, dado que a Comissão Europeia considera que, durante este intervalo de doze meses, a situação do Banif degradou-se. Logo, se a resolução tivesse lugar nos termos propostos por Bruxelas, os custos para os contribuintes poderiam ter sido menores.
Bruxelas argumentou ainda que o Estado português poderia ter recuperado “totalmente” os 825 milhões de euros que tinha a recuperar no Banif, relativos aos ‘CoCo bonds’ e acções especiais. “Um plano de reestruturação feito nestas linhas asseguraria a viabilidade (de partes) do banco e a sua capacidade de implementar de forma adequada as medidas de reestruturação, bem como de pagar a totalidade da ajuda de Estado recebida [825 milhões de euros] ou de, pelo menos, remunerar essa ajuda de forma adequada”, refere a missiva enviada mais de um ano antes da resolução do Banif.

“Se for apresentado um plano de reestruturação baseado nestas linhas, e partindo do princípio de que todas as informações, modelos e metodologias são consideradas válidas pelos meus serviços, estou convencida de que a Comissão Europeia poderia chegar rapidamente a uma decisão final, que daria ao banco a necessária previsibilidade”, refere a carta da comissária europeia da Concorrência, Margrethe Vestager.

A comissária lembrava ainda que Bruxelas estava a ser paciente com o Governo português, no que toca ao Banif, devido à necessidade de não pôr em risco a saída limpa do Programa de Assistência a Portugal. Margrethe Vestager salientava, no entanto, que era difícil sustentar que o Banif deveria ter um tratamento diferente do que foi aplicado ao BES, “ainda para mais quando tem muito menor dimensão”. “Por isso, a necessidade de actuação é ainda mais premente”, concluía.

As cartas enviadas pela comissão europeia à ex-ministra das finanças