Islândia: Um país subprime

O primeiro-ministro islandês Geir Haarde admitiu ontem que toda a banca da Islândia pode entrar em colapso e alertou a população para se preparar para o pior, durante uma sombria intervenção televisiva. Haarde frisou que o desmoronamento da banca levará ao colapso total da economia e à falência do próprio Estado. Caso se mantenha o nervosismo, o país pode ser, dentro de alguns dias, uma ilha na bancarrota, alertou. Na tentativa de controlar danos e prevenir riscos, o parlamento aprovou um plano de emergência que suspendeu as cotações dos bancos islandeses na bolsa de valores de Reykjavik. O Estado passou a controlar todas as decisões do sector bancário privado. A Islândia, com uma população de apenas 313 mil habitantes, apesar de ser um dos países mais ricos do mundo, está à beira da ruptura devido ao peso do sector financeiro na economia e à irresponsabilidade dos banqueiros do país em manobras especulativas. Nos últimos dez anos, o recurso a agressivas políticas de endividamento, através de bilionários empréstimos em países com taxas de juro muito baixas (Japão, por exemplo), os banqueiros e empreendores islandeses adquiriram activos no estrangeiro e internacionalizaram a economia da ilha. Só o sector financeiro representava, em Setembro último, oito vezes o PIB nacional. Bancos, fundos de investimento, hotéis, centros comerciais e cadeias de retalho em vários países da Europa, Américas e Ásia passaram a ostentar marcas islandesas. As operações, fortemente alavancadas com instrumentos derivativos de crédito, geraram um boom artificial e insustentável. A implosão do mercado hipotecário norte-americano, e o aperto global do crédito que se lhe seguiu, marcou o príncípio do fim das aventuras financeiras vikings. Em 2006, o défice externo era 1/4 do PIB nacional. Em 2007, voltou a crescer mais 17%. A dívida líquida externa de curto prazo era 15 vezes superior ao total das reservas monetárias do banco central da Islândia, e 2 vezes superior ao PIB. A mesma dívida, mas de longo prazo, era 350% superior à riqueza nacional. Nos balanços dos bancos islandeses, em Dezembro de 2007, o total dos activos contabilizados era 10 vezes superior ao PIB. Os excessos foram agravados com a privatização da banca em 2000. A gestão bancária caiu nas mãos de yuppies, sem experiência no sector, e de fundamentalistas das teorias económicas laissez-faire protagonizadas pelo economista norte-americano, Milton Friedman. O concubinato entre banqueiros e governantes ultra liberais, então no poder, encarregou-se do resto. A ausência de regulação e de regras prudenciais ditaram a falência do modelo islandês. O país transformou-se num verdadeiro hedge fund onde a orgia especulativa não conheceu limites. A ausência de riqueza nacional, suficiente para cobrir a especucalção meramente financeira, está agora a sentir-se. A moeda nacional – krona – perdeu metade do valor desde Janeiro. A inflação caminha aceleradamente para os 20%. Agora, o governo encara a possibilidade de controlar totalmente o sector financeiro, após ter nacionalizado parcialmente o banco Glitnir com uma injecção de EUR 600 milhões e assumido o controlo de 75% do capital. Num mundo onde o crédito é crescentemente escasso e caro, sem o apoio de outros países e de organizações financeiras multilaterais, será difícil evitar o colapso das finanças públicas islandesas. Depois da festa da dívida, a ressaca da conta. A Islândia ficará na história como o primeiro país subprime do mundo.

MRA Dep. Data Mining

Pedro Varanda de Castro, Consultor

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