O governo vai apresentar na próxima semana a reforma administrativa. O programa do executivo de Passos Coelho passa por alterações políticas, na gestão dos municípios, mas também no território, um “verdadeiro choque reformista, com vista ao reforço do municipalismo como veículo de gestão de território e de serviço aos cidadãos”, disse ao jornal i o secretário de Estado da Administração Local Paulo Júlio.
O memorando da troika impõe uma redução do número de autarquias e de freguesias, uma medida que tem levantado polémica entre os autarcas e que o governo não deve seguir, pelo menos com régua, esquadro e tesoura na mão. Ao i, Paulo Júlio prefere avançar que “o grande problema da sustentabilidade financeira dos municípios portugueses não é o elevado número de municípios, mas o seu modelo de gestão”.
Um estudo recente do “Research Institute for Knowledge Systems” alerta para o risco do encerramento de serviços no interior, bem como do comércio e de unidades industriais, o que terá consequências nos próximos anos. Até 2034, diz este estudo, a população do país vai concentrar-se sobretudo junto ao Litoral. As áreas mais afectadas serão Lisboa, Porto e Algarve, uma tendência que já se tem verificado nos últimos anos.
O argumento do perigo de despovoamento do interior, com a perda de serviços, é recorrente e pode bem vir a servir ao governo para justificar uma leitura mais conservadora deste ponto da troika, contornando a questão da extinção de municípios.
O presidente da Liga de Protecção da Natureza e perito em matéria de desertificação, Eugénio Sequeira, explica ao i que “a diminuição das autarquias é o resultado do despovoamento, mas também causa mais despovoamento”. Este movimento de saída para o litoral acarreta outro risco para estas zonas: “São construídas mais casas, utilizados mais recursos hídricos, que acabam com ecossistemas e aumentam os riscos de catástrofe”, diz Sequeira.
O estudo a que o i teve acesso mostra ainda que nos próximos quinze anos o despovoamento vai criar um uso reduzido das terras do interior e que com isso vai aumentar a impermeabilização do solo no litoral. A concentração da população na costa vai provocar, por isso a diminuição da área florestal nesta zona.
O governo tem de reduzir nos próximos dois anos cerca de 100 milhões de euros por ano nas transferências para as autarquias, de acordo com a troika. Neste momento a despesa pública na administração local é de cerca de 251 euros per capita, um montante que fica abaixo de países como a Holanda, Espanha, Itália ou mesmo da Alemanha.
Também no número de autarquias, quer por área quer por número de habitantes, Portugal (34000 habitantes em média) fica longe de países como a França (1758), Espanha (5655), Alemanha (6758) ou Itália (7437). Depois das alterações impostas, a Grécia ficou, mesmo assim, com mais câmaras que Portugal e aproximadamente com a mesma média de habitantes por câmara municipal.
Na reforma administrativa, o governo vai transferir para as câmaras mais competências em áreas como na Educação – em matérias de construção, manutenção e gestão de escolas -, na Saúde – na participação no planeamento de equipamentos de saúde – e na Acção Social, tal como defendido no programa do governo.
MRA Alliance/ionline