A França assumiu ontem (01/07/2008) a presidência rotativa da União Europeia (UE) com a intenção de tentar um acordo entre os 27 Estados Membros para endurecer a política do bloco relativamente à imigração, tema especialmente caro aos africanos, latino americanos e asiáticos. Assim, por pressão do Brasil, os presidentes dos países do Mercosul emitiram ontem uma declaração conjunta “rejeitando” a criminalização da imigração irregular para a UE. Neste contexto, o presidente do Brasil, Lula da Silva, citado pela BBC afirmou durante a presente cimeira do Mercosul, que os imigrantes latino-americanos sofrem uma “perseguição odiosa” na Europa e, juntamente com os estados do bloco sul-americano prometeu uma “defesa intransigente” dos direitos dos cidadãos latino-americanos residentes na UE e da “reciprocidade de tratamento” entre os nacionais dos dois blocos.
O presidente francês, Nicolas Sarkozy, contudo, pretende deixar a sua marca pessoal no domínio dos Direitos, Liberdades e Garantias dos euro-cidadãos, nos seis meses em que liderará a UE. Uma das suas quatro prioridades é aprovar um “pacto consensual” que proíba a regularização maciça de estrangeiros ilegais como fizeram a Espanha e a Itália nos últimos anos. Em 7 e 8 de Julho, durante uma reunião ministerial em Cannes (França), a presidência francesa tentará convencer os seus pares a repôr os controlos fronteiriços derrogados com o aprofundamento do mercado interno. “A França, ou a Europa, não vão aceitar toda a miséria do mundo”, disse ontem o conservador Sarkozy. O ex-primeiro-ministro socialista francês, Michel Rocard, em 1990, defendeu uma posição semelhante retocada semanticamente com o “dever” da França de “assumir fielmente a sua responsabilidade” nas políticas migratórias.
A imigração é a área em que Sarkozy poderá eventualmente conseguir os resultados que pretende já que nas outras três – energia/meio ambiente, agricultura e defesa – os consensos serão problemáticos. As novas regras europeias sobre imigração, designadamente a chamada “directiva de retorno”, aprovada em Junho pelo Parlamento Europeu, estabelecendo que os estrangeiros em situação irregular na UE podem ser detidos até 18 meses antes de serem deportados, prometem azedar os diálogos Norte-Norte e Norte-Sul. Sarkozy pretende operacionalizar nos 27 a política francesa de “imigração selectiva” fazendo a importação de cérebros e de competências estrangeiras mas bloqueando a entrada aos não europeus sem qualificação profissional.
Em Espanha, o relatório “Imigrantes: Novos cidadãos. A caminho de uma Espanha Intercultural” elaborado pela Confederação Espanhola de Bancos concluiu que parte dos espanhóis associa a imigração à delinquência, terrorismo e a outros fenómenos relacionados com a segurança militar e civil. Em 2000, o índice de rejeição era de 10%. Nos primeiros meses de 2008, um terço dos espanhóis (30%) confessou ser xenófobo. Quatro entre cada dez entrevistados, por exemplo, confessaram preferir não ter um vizinho imigrante ou cigano. Seis em cada dez atribuíram o aumento da insegurança aos estrangeiros. Talvez por esta razão, mais moderado e realista, o primeiro-ministro espanhol José Luis Zapatero minou as pretensões francesas com o conceito do “contrato de integração” que estabelece requisitos culturais e linguísticos para os novos imigrantes.
Georges Couffignal, director do Instituto de Altos Estudos da América Latina (Universidade Sorbonne), citado pela BBC BRASIL, reconheceu como “muito provável” que a imigração seja um dos principais pomos da discórdia entre europeus e latino americanos durante o consulado francês à frente dos destinos políticos da UE, colocando-o no plano ético: “É mais uma questão de princípios, já que a América Latina foi uma terra que recebeu imigração europeia (…) “[Agora] é difícil para os latino-americanos compreender que as portas lhes sejam fechadas”, rematou.
Por seu turno, em entrevista ao jornal argentino Clarín, Alfredo Mantica, Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros italiano, com a tutela da cidadania e imigração, confirmou que o governo de Roma, agora liderado pelo conservador Silvio Berlusconi, tem a intenção de exigir normas mais restritivas para a concessão da cidadania. Tal possibilidade também já fora considerada pelo anterior executivo romano – a coligação de centro-esquerda liderada pelo ex-presidente da Comissão Europeia, Romano Prodi. O representante da Argentina na Câmara dos Deputados italiana, Ricardo Merlo, eleito pelos eleitores transalpinos residentes no estrangeiro, afirmou-se “totalmente contrário” à obrigatoriedade de conhecer a língua italiana para ter a cidadania. Merlo foi peremptório: “Não é justo. A cidadania é um direito constitucional que devemos defender sem condições. O direito de sangue é-nos reconhecido. Conheço italianos que não falam italiano, como os que moram na região sul do Tirol, que falam dialeto austríaco. Não há discussão”, disse o deputado à BBC Brasil.
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