O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, abriu hoje em Genebra a segunda edição de uma Conferência sobre o Racismo (Durban II) marcada pelo boicote dos EUA e de vários países do Ocidente. A presença do presidente iraniano, Mahmud Ahmadinejad, levou a Casa Branca a alertar contra o antagonismo “hipócrita” face a Israel. Ki-moon ripostou com a equiparação entre anti-semitismo e “islamofobia”.
A abertura do púlpito de Durban II ao Presidente iraniano Mahmud Ahmadinejad, assumido crítico do Estado hebraico e dos pressupostos do Holocausto é o argumento utilizado para o boicote por todos os países aliados de Israel.
A diplomacia israelita, muito activa nas últimas semanas, conseguiu os seus objectivos: esvaziar politicamente a reunião destinada a dar sequência à Cimeira de Durban, organizada há oito anos na África do Sul. Um total de oito nações do flanco ocidental fica à margem dos trabalhos de Genebra em solidariedade com Israel – EUA, Alemanha, Polónia, Holanda, Itália, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. A França faz-se representar em Genebra por uma delegação diplomática de segunda linha, à semelhança da Grã-Bretanha e da República Checa.
A posição da administração Obama foi conhecida no sábado. Apesar de os diplomatas responsáveis pelo projecto de declaração final terem mantido uma referência à memória do massacre de seis milhões de judeus às mãos do regime nazi, a Casa Branca dissociou-se da iniciativa das Nações Unidas. Já o fizera em 2001, quando a delegação da administração Bush/Cheney abandonou Durban perante a tentativa de equiparar o anti-semitismo a um fenómeno racista.
O ministro francês dos Negócios Estrangeiros Bernard Kouchner, ameaçou que ao menor sinal de ataque anti-semita no discurso a proferir por Mahmud Ahmadinejad ditará o abandono precoce dos representantes franceses.
Antagonismo “hipócrita e contraproducente”
Ao demarcar-se de Durban II, o Presidente norte-americano, Barack Obama, escudou-se no argumento de que os Estados Unidos não podem estar associados a uma iniciativa aberta a dirigentes com posições anti-semitas, nomeadamente o Presidente do Irão, para quem o Holocausto não passou de um logro de assinatura sionista. A Casa Branca teme que os trabalhos da Cimeira das Nações Unidas, a decorrer até sexta-feira, redundem num palco de antagonismo “hipócrita e contraproducente” para com o Estado hebraico.
O mesmo receio alastra-se aos aliados europeus dos Estados Unidos. No entanto, a União Europeia divide-se entre a via do boicote e a solução de compromisso do Governo francês. Uma cisão condenada de viva voz pelo ministro italiano dos Negócios Estrangeiros, Franco Frattini: “Agir como uma testemunha silenciosa não compensa, apenas nos arriscamos a ser cúmplices”.
No entender das organizações não-governamentais, a polémica em torno de Mahmud Ahmadinejad reúne todas as características de uma manobra de diversão. Até porque o problema não está na presença do Presidente iraniano, ou no dossier do conflito israelo-palestiniano, mas antes na “intolerância” e na “discriminação” dos países ocidentais face à imigração. Isso mesmo foi reafirmado à RTPN por Mamadou Ba, dirigente da SOS Racismo em Portugal.
Israel intensifica manobras diplomáticas
No discurso de abertura da Cimeira de Genebra, o secretário-geral das Nações Unidas procurou resgatar Durban II a um fracasso que as ONG dizem ser inevitável. Depois de fazer a apologia do “equilíbrio” emprestado ao projecto de declaração final, Ban Ki-moon disse estar “profundamente desapontado” com a ausência de “algumas nações que, por direito próprio, deveriam ajudar a criar o caminho para um futuro melhor”.
Ban Ki-moon exortou também a comunidade internacional a unir esforços contra a ameaça de uma intolerância em crescendo, sobretudo no contexto da crise económica e financeira. Quanto ao racismo, o combate deve ser travado contra todas as formas do fenómeno, incluindo o anti-semitismo e a mais recente “islamofobia”.
Israel não desarma. Já esta segunda-feira, no início da reunião semanal do Conselho de Ministros, o chefe do Executivo israelita voltou a condenar o convite enviado ao Presidente iraniano, que apodou de “negacionista” e “racista”.
“No momento em que nos preparamos para lembrar as vítimas da Shoah, uma conferência que se propõe lutar contra o racismo acolhe um racista e um negacionista da Shoah que não esconde a sua intenção de erradicar Israel do mapa”, declarou Benjamin Netanyahu. Israel, afirmou o sucessor de Ehud Olmert, “felicita os países que decidiram boicotar o festival do ódio”.
Na mesma linha, o ministro israelita dos Negócios Estrangeiros, Avigdor Lieberman, sublinhou que o Estado hebraico “não pode ignorar o facto de a conferência, que acolhe um negacionista da Shoah, decorrer precisamente no dia em que o povo judeu lembra os seis milhões de vítimas massacradas pela Alemanha nazi e os seus simpatizantes”.
A última operação da guerra diplomática de Telavive contra Durban II envolve Ilan Legari, embaixador de Israel na Suíça. O Governo israelita convocou o seu representante diplomático em Berna para consultas após um encontro entre o Presidente suíço, Hans-Rudolf Merz, e o homólogo do Irão.
Estudo: “Israelitas apioam racismo”
Em Março de 2008, a MRA Alliance, divulgou os resultados de um estudo segundo o qual o fenómeno do racismo em Israel é uma realidade. “A comunidade israelo-judaica apoia de forma crescente a segregação, discriminação e deportação de árabes israelitas segundo um relatório sobre racismo em Israel, elaborado pelo Mossawa, Centro para a Defesa dos Cidadãos Árabes de Israel, informou o jornal israelita de centro-esquerda Haaretz. O relatório, divulgado publicamente no final do primeiro trimestre, em Nazaré, considera que o conflito israelo-palestiniano influenciou a opinião pública israelita que, crescentemente, defende ideias racistas. O estudo alerta igualmente que vários políticos judeus estão a ganhar influência com base na defesa de posições favoráveis ao ódio racial.” Mais aqui.
MRA Alliance/RTP