Nas últimas semanas, vários leitores da MRA Alliance interrogaram-se sobre as justificações técnicas e racionais para a queda de algumas matérias-primas cujos preços, num ambiente de colapso dos mercados financeiros, de incerteza e algum pânico, deveriam ter evoluções de preço diferentes das tendências actuais. A questão está relacionada com potentes dinâmicas especulativas que, pela sua dimensão, mas à margem da lei, conseguem em poucas semanas manipular as cotações consoante os interesses dos grandes conglomerados financeiros e industriais.
No que toca ao ouro e à prata, aqui fica a explicação. As mesmas práticas aplicam-se a outras matérias-primas – das alimentares, ao petróleo, gás, minerais, etc. O mercado das opções e dos futuros – sujeito a regulação pelas autoridades competentes – é o cenário. O exemplo que escolhemos foi compilado pelo especialista em metais preciosos, Theodore Butler, da Silver Seek, LLC, e por nós adaptado.
Participação dos Bancos em Mercados Futuros de Ouro e Prata
Julho/Agosto 2008

Fonte: silverseek.com
OS NÚMEROS
PRATA: Em 01/Jul/2008, dois bancos americanos detinham 6 199 contratos a descoberto (short) na mercadoria COMEX Silver, equivalentes a 30 995 000 onças. Em 5/Ago/2008, dois bancos americanos detinham 33 805 contratos COMEX Silver, equivalentes a 169 025 000 onças – um aumento superior a 500%. Trata-se da maior posição alguma vez registada pelas estatísticas oficiais. Entre os dias 14 de Julho e 15 de Agosto, o preço COMEX Silver caiu 38% – de USD 19,55 (base Setembro) para USD 12,22.
OURO: Em Julho, três bancos americanos detinham 7 787 contratos a descoberto (short), na mercadoria COMEX Gold, equivalentes a 778 700 onças. No mês seguinte, três bancos americanos detinham 86 398 contratos na mercadoria COMEX Gold, equivalentes a 8 639 800 onças – um aumento superior a 1100%, coincidente com a queda das cotações do ouro em cerca de USD 150/onça. Tal como no caso da prata, esta foi a maior posição a descoberto detida por bancos norte-americanos no histórico estatístico da CFTC/Commodities Futures Trade Commission, disponível no site. A posição foi assumida pouco antes do colapso dos preços.
A ANÁLISE
Os números sugerem a existência de uma massiva manipulação do mercado e levantam um conjunto de questões suscitadas pelo analista da Silver Seek:
“― Existe alguma relação entre a venda adicional de 27 606 contratos futuros de prata (130 milhões de onças) no espaço de um mês, imediatamente seguido por uma forte queda das cotações daquela commoditie? O valor equivale a 20% do total da produção mineira mundial e à totalidade das existências armazenadas fisicamente pela COMEX, o segundo maior inventário de prata do mundo. Como poderia o preço não ser influenciado pela venda concentrada de tais quantidades num período tão curto de tempo?
― Existe alguma relação entre a venda adicional, por três bancos americanos, de 78 611 contratos futuros (7 861 100 onças), no espaço de um mês, logo seguida por uma queda violenta dos preços do ouro? O valor é equivalente a 10% da produção anual de ouro e ascende a USD 7 mil milhões/bilhões (mm/bi), transaccionados por três bancos em contratos futuros no espaço de um mês. Como pode uma extraordinária concentração de volume de vendas não ser uma manipulação?
― Por os preços terem caído tão violentamente, após as vendas a descoberto, os detentores de inventários físicos de prata, a nível global, registaram um decréscimo em valor que ultrapassou USD 2,5 mm/bi, pelo que, os detentores de contratos long sofreram perdas de igual dimensão. No caso do ouro, as perdas dos investidores foram muito superiores uma vez que o valor em dólares é muito maior que o da prata – da ordem das centenas de mm/bi – em termos de inventário físico. A queda das acções das companhias mineiras cotadas soma mais uns milhares de milhões aos prejuízos. A quebra do valor do ouro foi provocada pela venda concentrada e a descoberto por dois ou três bancos norte-americanos?
― Que negócio legítimo exercem os dois ou três bancos, para, de repente, venderem short tamanhas quantidades de instrumentos especulativos, num período tão curto? Queremos bancos envolvidos neste tipo de actividade? Se a manipulação não foi bem sucedida os contribuintes norte-americanos seriam novamente chamados para salvar outra especulação bancária que correu mal?
― Terão os traders que registaram prejuízos no recente colapso dos preços razões para acreditar que o seu dinheiro está agora nos cofres daqueles dois ou três bancos? Se assim for, será que têm hipóteses de recurso?”, remata Theodore Butler.
Os factos relatados apontam claramente para uma manipulação de proporções gigantescas. Um escasso número de bancos operou um dos maiores colapsos de preços na história dos metais preciosos. Operações do mesmo tipo justificam a queda dos preços destas e de outras commodities completamente à revelia da oferta e da procura.
Dá para entender o motivo pelo qual o ouro (mercado spot) oscilou ontem (23-10-2008) entre USD 733,60/736,10, escassas semanas depois de quase ter atingido a cotação de USD 1 000/onça?
A manobra é tão escandalosa quanto o silêncio e inacção das autoridades reguladoras do mercado norte-americano.
MRA Alliance, Dep. Data Mining
Pedro Varanda de Castro, Consultor
Fonte Analítica: Theodore Butler
Fonte Estatística: Commodities Futures Trade Commission
Os dados encontram-se nas secções de futuros de Julho e Agosto/2008