Os portugueses decidem hoje a composição do futuro parlamento e a eventual saída do socialista José Sócrates da chefia do governo. Embora as indicações da afluência às urnas, nas primeiras horas da votação, apontem potencialmente para uma maior participação dos eleitores residentes em Portugal, o mesmo não se pode dizer da maioria das comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo.
Com efeito, os cidadãos portugueses que residem no estrangeiro e que pediram para que lhes fosse enviado o boletim de voto, para poderem votar por correspondência, não o receberam. Os casos mais numerosos foram detectados na América Central e do Sul – México, Venezuela e Brasil. Mas o exemplos multiplicaram-se noutros continentes.
Nuno Godinho de Matos, porta-voz da Comissão Nacional de Eleições, disse no sábado que, nestes casos, os que “ainda não receberam os boletins já não vão receber”, por o prazo para o reenvio por correio expresso às custas do eleitor, “já ter terminado”.
Uma fonte da Direcção-geral da Administração Interna (DGAI) disse à Agência Lusa que para as eleições de hoje foram enviados, entre 5 e 11 de Maio, 8.763 boletins de voto para África, 103.410 para as Américas, 7.880 para a Ásia e Oceânia e 75.076 para a Europa.
A soma não chega aos 200 mil. Para uma comunidade estimada em 5 milhões de portugueses e luso-descendentes, a quantidade de votantes nos circulos da emigração é decepcionante, representando uma mancha negra no modelo democrático e parlamentar português instituído após o 25 de Abril.
De facto, o recenseamento de eleitores portugueses no estrangeiro apontou, em Dezembro de 2010, para total de 228 232 pessoas com capacidade eleitoral, segundo números então divulgados pela DGAI. Daquele total, o maior número de eleitores inscritos está radicado nas Américas (106.782), seguindo-se a Europa (95.671). Vêm depois a Ásia/Oceânia (14.966) e África (11.413).
Como se isto não bastasse, em Maio passado, já o deputado social-democrata pelo círculo da emigração na Europa, Carlos Gonçalves, denunciara que muitos portugueses residentes no estrangeiro não receberam o boletim de voto porque quando pediram o cartão de cidadão em Portugal lhes foi atribuída uma morada em território nacional.
Gonçalves explicou que quando as pessoas fornecem uma morada portuguesa para fazer o cartão de cidadão essa morada é automaticamente associada ao recenseamento eleitoral em território nacional. Para o deputado, este problema tem origem na falta de informação das pessoas sobre as regras de funcionamento do novo documento.
O cabeça-de-lista do PSD pela Europa, durante acções de campanha realizadas em Maio, em França, destacou que as questões da participação cívica e política dos emigrantes e o ensino da língua portuguesa são as grandes prioridades e as razões para o grande descontentamento que grassa nas comunidades lusófonas, contra as políticas não inclusivas de Lisboa.
Gonçalves destacou ainda que, em seis anos, o Governo socialista “não teve iniciativas relativas à participação cívica e política” dos emigrantes e dos seus descendentes. “Não é normal que se esteja a prometer durante seis anos a realização de um fórum de luso-eleitos, que nunca se concretizou. Mais grave é que havia regularmente em França um encontro de eleitos, que não teve lugar nos últimos anos e não foi por culpa da embaixada de Portugal”, disse. Para o deputado do PSD esta falta de sensibilidade para as questões cívicas e políticas são as mais graves na acção do governo.
Se a estes sinais acrescentarmos a suspensão pela RTP, desde 1 de Junho, das emissões da RDP Internacional em Onda Curta, alegando como motivos a redução do número de ouvintes e a vontade de diminuir os custos, poderemos concluir que, 37 anos depois, os emigrantes portugueses espalhados pelo mundo continuam marginalizados do processo democrático que inaugurou a Terceira República…
Pedro Varanda de Castro
MRA Alliance